São Paulo, domingo, 8 de dezembro de 1996
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Meninos ensinam adultos a ganhar dinheiro

GILBERTO DIMENSTEIN

Um grupo de meninos americanos está ensinando os adultos a arte de brincar e ganhar dinheiro.
Em 1994, Greg Miller tinha nove anos e resolveu criar jogos para estimular crianças a gostar de computadores. Com ajuda de amiguinhos, ele distribuiu pela Internet, a rede mundial de computadores, o jogo "Príncipe da Índia". Imaginava que aquele joguinho, com toques educacionais, seduziria meninos e meninas, introduzindo-os no prazer da informática.
Logo descobriria que todos adoraram sua invenção e deixou os ideais filantrópicos. Hoje Miller tem 12 anos, é dono de uma empresa de software chamada Tenadar, na Califórnia, onde as reuniões misturam planilhas, doces, balas e batata frita.
Com o lema "incríveis softwares, de criança para criança", Miller, com rosto de menino sapeca, aumenta o pânico dos adultos, atarantados com a velocidade das mudanças tecnológicas.
A velocidade produz uma geração de jovens milionários, muitos deles ainda na faculdade (como Bill Gates, que ganhou seu primeiro bilhão antes dos 30 anos), que ganham dinheiro e nem sequer completam seus estudos.
Além do prazer pelo dinheiro, eles têm em comum o ódio por terno, gravata, reuniões formais, e, se puderem, só andam de tênis.
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O problema é que, na era da informação, vale o velho ditado: fácil vem, fácil vai. Esse ditado ganhou nos EUA um novo formato por meio de uma frase da moda: "Só os paranóicos sobrevivem". Pesquisadores mostram que diminui o tempo entre o nascimento e morte de uma empresa.
Uma das estrelas mundiais da tecnologia se chama Marc Andreesen, criador da Netscape, responsável pela popularização da Internet. Localizando: ele está para a Internet como Albert Sabin está para o combate à paralisia infantil.
Com 25 anos, está bilionário e revela que não teme os grandes barões e sim o garoto que, neste momento, está numa garagem, sozinho, burilando invenções. Daquela garagem é capaz de sair uma idéia que viraria tudo de pernas para o ar, dizimando seus negócios.
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Invenções que dizimam negócios não são obviamente nada de novo. A novidade é o ritmo das descobertas e a facilidade de sua implantação. "Cada vez mais um negócio depende mais da inteligência e menos do trabalho braçal", afirma o diretor da Faculdade de Economia de Chicago, Alexandre Scheikman.
Ele vê diariamente um fenômeno de todas as universidades americanas. Homens engravatados com muito dinheiro rastejam atrás de estudantes com muitas idéias e nenhum dinheiro, propondo sociedade.
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O mundo da tecnologia não pára de produzir histórias de jovens que oferecem ações de suas empresas na Bolsa e, no dia seguinte, quando acordam, estão milionários.
Steven Jobs lançou este ano ações de sua empresa (Pixar) e, num único dia, faturou US$ 1 bilhão. Motivo: tinha acabado de jogar no mercado um de seus produtos, o filme de animação "Toy Story", que atraiu multidões de crianças.
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Jovens milionários são, entretanto, uma linha da teia das novas relações de trabalho, muito mais democráticas. Nunca tantos americanos resolveram ser patrões de si próprios, graças ao fato de que, com um computador na mão conectado a uma linha, prestam serviços e ganham dinheiro sem sair de casa. Não é necessário investimento, apenas cabeça.
De acordo com pesquisas, 60% dos americanos sonham em ser patrões, mesmo que não tenham nenhum empregado. Muitos estão conseguindo. No ano passado, 1 milhão de pessoas inauguraram seus próprios negócios.
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Comentário do professor Scheikman: os empresários brasileiros devem se preocupar tanto com a educação como se preocupam com o valor da moeda. E os repórteres de economia deveriam saber que, hoje, falar em escola é como, no passado, falar em transporte e energia como fatores de desenvolvimento.
A verdade: o Brasil ainda não desenvolveu o sentido da calamidade pública na educação. E não vai desenvolver sem o fortalecimento de novas lideranças empresariais mais modernas com expressão nacional, olhando menos para Brasília e mais para o Brasil; gente que faça menos lobby não só para seus lucros (o que é legítimo), mas também por seu país.
Perdôo os líderes sindicais porque eles não tiveram a chance, em sua maioria, de estudar e apenas estão reproduzindo a ignorância que herdaram. Do contrário, estariam infernizando a vida dos secretários da Educação. Afinal, filho de trabalhador estuda em escola pública.
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Corrupção conseguiu mobilizar muito mais a sociedade do que educação. Já não se produzem escândalos como antigamente -o que mostra mais uma vez como o Brasil avança. Diante da denúncia de "O Globo", feita pelo ministro Gustavo Krause, sobre pedido de propinas no Congresso, foram tomadas medidas rapidamente -a começar pelo afastamento do deputado acusado de achacar a empreiteira Andrade Gutierrez.
Aviso aos imbecis do pessimismo: não é elogio aos governantes, mas a uma sociedade que evoluiu e cada vez mais enquadra o poder público. Quem não reconhecer essa obviedade, não reconhece o valor da democracia. Quem não sabe detectar nada correto é tão imbecilizado quanto quem não detecta nada de errado.
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PS - Por falar em lobby e escândalo, pesquisa divulgada na semana passada informa que o câmbio não produziu a catástrofe que anunciavam empresários e economistas. Empresas estão ganhando ainda mais dinheiro com exportação. Mais uma para meu arquivo sobre economistas e suas maravilhosas previsões, muito dos quais alertaram que o Brasil seria o novo México. Deveríamos chamar os meninos da Califórnia para dar-lhes aula de maturidade -e de economia, claro.

Fax: (001-212) 873-1045
E-mail: gdimen@aol.com

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