São Paulo, terça-feira, 10 de dezembro de 1996
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Máxi abalaria os bancos

CELSO PINTO

Uma das razões para o governo evitar qualquer desvalorização cambial mais forte é o estrago que ela faria sobre o sistema bancário. Dados do Banco Central mostram que o impacto seria muito forte. O total dos passivos em dólares que os bancos comerciais e múltiplos tinham no final de maio, e que não estavam cobertos por ativos em dólares, chegava a US$ 29 bilhões, maior do que o patrimônio líquido desses bancos, de US$ 27 bilhões. Ou seja, a vulnerabilidade dos bancos em relação a dívidas em dólares era maior do que seu capital e reservas livres. Os dados do BC, trabalhados pela empresa de consultoria MB Associados, mostram a crescente importância das operações em dólares para os bancos privados. Obviamente, o mesmo se aplica às empresas privadas, cada vez mais endividadas em dólares.
Os bancos múltiplos tinham US$ 57,2 bilhões em passivos em dólares no final de maio, dos quais US$ 21,8 bilhões a curto prazo (38%), US$ 11 bilhões a longo prazo (19%) e US$ 24,3 bilhões em operações de câmbio (43%). Esses passivos em dólares equivaliam a um terço do total de passivos.
Do lado dos ativos, esses bancos tinham US$ 33,3 bilhões, dos quais US$ 26,7 bilhões em operações de câmbio e US$ 6,5 bilhões a curto prazo. O total dos passivos em dólares, portanto, superava o dos ativos em US$ 23,8 bilhões. Em outros termos, esses US$ 23,8 bilhões eram o tamanho da vulnerabilidade dos bancos a alguma variação cambial brusca.
Esse passivo em dólares a descoberto representava 95% do patrimônio líquido dos bancos múltiplos em maio, de US$ 25 bilhões.
A situação dos bancos comerciais era ainda mais vulnerável. O passivo em dólares era de US$ 13,4 bilhões, para ativos em dólares de US$ 8,2 bilhões. O total a descoberto, portanto, era de US$ 5,2 bilhões, ou quase duas vezes e meia maior do que o patrimônio líquido de US$ 2,1 bilhões. Os passivos em dólares desses bancos equivaliam a 59,7% do total de passivos.
Juntos, os bancos múltiplos e comerciais tinham um total de passivos em dólares a descoberto de US$ 29 bilhões, equivalentes a 107% do seu patrimônio líquido. Olhando esses números é fácil entender por que a cada rumor de mudança cambial que surge no mercado há uma corrida dos bancos para comprar ativos em dólar para se proteger.
No caso dos bancos de investimento, os passivos em dólares eram de US$ 2,1 bilhões (38% do total de passivos), para ativos em dólares de US$ 1,3 bilhão. A diferença, de US$ 774 milhões, equivalia a 37,8% do patrimônio líquido. Outro banco que ficaria claramente vulnerável a uma maxidesvalorização é o Banco do Brasil. Seu passivo em dólares, de US$ 10,1 bilhões, era bem superior aos ativos em dólares, de US$ 7,1 bilhões. Os US$ 3 bilhões representavam 71% do patrimônio líquido do BB em maio. A situação do BNDES é bem mais tranquila. Embora a diferença entre passivos em dólares (US$ 13,8 bilhões) e ativos (US$ 18 milhões) seja grande, em termos relativos ela equivalia a apenas 3,3% do patrimônio líquido do BNDES.
No total, o conjunto de bancos tinha US$ 84,4 bilhões de passivos em dólares, para US$ 50 bilhões de ativos em dólares. A diferença de US$ 34,4 bilhões estava sem cobertura. Como os dados são de maio, é razoável imaginar que os dados atuais são ainda mais expressivos. A vulnerabilidade dos bancos a uma maxidesvalorização, a rigor, é maior do que a simples diferença entre passivos e ativos em dólares. Grande parte dos ativos são aplicações em empresas e é previsível supor que uma máxi deixaria muitos desses clientes em dificuldades. Foi exatamente o que aconteceu no México. Depois da crise de dezembro de 94, que gerou uma desvalorização que chegou a 100% nos primeiros meses, o sistema financeiro e as empresas entraram em colapso. Até hoje a situação dos bancos mexicanos continua delicada.

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