São Paulo, quarta-feira, 11 de dezembro de 1996 |
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Altman volta às origens em seu novo filme
WAGNER ARAÚJO
O sucesso no cinema veio com "M*A*S*H" (70), seguindo-se títulos como "Nashville" (75), Popeye (80), "O Jogador" (92), "Short Cuts - Cenas da Vida" (93), "Prêt-à-porter" (94). Altman e o ator Harry Belafonte, protagonista de "Kansas City", falaram à Folha em Londres, onde o filme concorreu no London Film Festival. * Folha - O que o sr. fazia em Kansas City na época em que o filme é ambientado? Robert Altman - Naquele tempo eu comecei a frequentar os bares onde os negros tocavam jazz. Muitos dos personagens foram baseados em pessoas reais. Eu conheci muitas daquelas pessoas e e elas me tratavam bem. Eu passei muito tempo de minha vida ouvindo aquela música e fazendo parte daquela cultura. Muitos temiam ou odiavam o gângster Seldon Seen, vivido na tela por Harry Belafonte. Ele foi um tipo muito especial. Outras referências reais usadas para construir os personagens vêm de músicos, minha avó e meu pai. Há muito de minhas vivências e memórias no filme, mas mostradas de uma forma romantizada, recriadas para o cinema. Outras informações foram levantadas por pesquisa. Folha - O filme é um musical? Altman - A música é o jazz, mas mais do que isso, os personagens são instrumentos musicais. Musical é "Robert Altman's Jazz 34 - Remembrance of Kansas City Swing", um documentário que fiz comentando "Kansas City". Entretanto, eu queria que os músicos fossem reais, e todas as cenas quando eles tocam foram tomadas ao vivo. E foi grande, eles conseguiram passar drama e verdade. As jam sessions tomaram três semanas para serem gravadas. Harry Belafonte - O melhor desse filme é a vida: os músicos tocaram, muitas coisas aconteceram realmente. Por isso é um filme diferente. Bob não pode dizer, mas eu acho esse o melhor filme dele. Folha - Como é a relação de Altman com os atores? Belafonte - Ele acredita nos atores, é muito liberal. Nesse filme a gente estava lidando com linguagem, meio social, história, e foi mais excitante. Com Bob você pode improvisar. Isso é estimulante. Folha - Como era Kansas City na época de sua infância? Altman - Kansas City naquela época foi um lugar à parte, uma cidade ativa e próspera. Como um ponto intermediário entre o leste e oeste dos EUA, atraiu muita gente, dinheiro e negócios. Havia muito trabalho, inclusive para músicos. Apesar das dificuldades da Depressão, Kansas City sobrevivia como um oásis, quase uma cidade sem lei, cheia de corruptos e gângsters, dominada por um político chamado Tom "Boss". O filme todo foi rodado lá. Folha - O gângster Seldon não morre no final do filme... Altman - Isso só acontece em filmes, na vida real eu não acho que aconteça. Belafonte - Há mais gângsters e criminosos na América que sobrevivem do que os que morrem. Altman - Como políticos, jogadores... Folha - Os personagens negros têm muita força neste filme... Belafonte - Certo tipo de cinema para mim é muito estranho, principalmente aqueles que dizem que os negros devem agir de tal forma, pensar de tal forma; os jogadores de basquete, por exemplo, são representados sempre do mesmo jeito. Altman - Mas uma grande parte dos americanos vive, fala, se veste como nos filmes de Spike Lee, como em "Kansas City". A música foi uma alternativa ao trabalho escravo e os negros a colocaram sob a direção deles. Folha - Qual o papel que a música tem na sua vida? Altman - Eu sempre gostei muito de música e o jazz foi uma das coisas que me fez ir aos bares "negros" de Kansas City -além da movimentação de pessoas, do clima estranho por lá. Nós tivemos empregados negros em casa e eu ouvia a música deles. Folha - Mas isso não era problemático para um garoto branco? Altman - Eu me apaixonei por aquela música. "Solitude", com Duke Ellington, me colocava nas alturas. E hoje eu vejo que o jazz está retomando a força, muitos jovens estão ouvindo, comprando. O rock e o rap são chatos e sem vida. Texto Anterior: "Dona Anja" copia mal pornochanchada e Globo dos anos 70 Próximo Texto: Masp exibe 62 imagens da Coleção Pirelli Índice |
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