São Paulo, sexta-feira, 13 de dezembro de 1996
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O combate à sonegação

PAULA B.F.M. DA COSTA; LUIZA C.F. FRISCHEISEN

PAULA B.F.M. DA COSTA e LUIZA C.F. FRISCHEISEN
O projeto de lei 2.448, de 1996, que altera o Imposto de Renda das pessoas jurídicas, deve conter dispositivo de processo penal. O artigo 83 protela a "representação fiscal para fins penais" pela Receita Federal ao Ministério Público para momento posterior à decisão final administrativa.
O projeto que então fez nascer a lei 9.249/96, também sobre Imposto de Renda, trazia previsão semelhante, vetada pelo presidente da República.
Este ano, outra vez, insiste-se em introduzir no ordenamento jurídico a alteração, que é inconstitucional porque retira do Ministério Público a possibilidade de analisar se a autuação fiscal realizada pela Receita constitui crime contra a ordem tributária.
Essa possibilidade, que deve acontecer imediatamente à autuação fiscal, indício de crime, é adiada para anos depois, quando esvaídas as oportunidades de produção de prova.
Não se pode deixar o Ministério Público aguardando menor ou maior tempo que a Receita demora para concluir procedimento administrativo contraditório.
Essa inovação contraria todas as regras de processo penal, direcionadas para a espontaneidade da persecução penal.
O Ministério Público, entendendo que há crime, tem o dever de levar o fato ao conhecimento do Poder Judiciário, por meio da ação penal. A limitação dessa sua atribuição, posta no artigo 83 do projeto a ser votado no Senado, ofende o artigo 5º, 35, da Constituição: "A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito".
Todo crime implica lesão a direito ou ameaça de lesão. Se essa lesão não puder ser conhecida pelo Judiciário no momento em que o Ministério Público, titular da ação penal pública por imposição também constitucional, entender, após avaliação técnica, que houve crime, então estará sendo violada a Constituição.
A sonegação fiscal caracteriza evidente violação de direitos da comunidade. Os tributos devem ser pagos para que sejam promovidas medidas suficientes para que todos tenham condições mínimas de vida com dignidade. Se o dispositivo for aprovado, espera-se do presidente da República que repita o veto, com o argumento da inconstitucionalidade.
Se não o fizer, terá o Ministério Público que requisitar da Receita cópia de todos os procedimentos administrativos instaurados em decorrência de autuação fiscal. Também nessa hipótese suas atribuições constitucionais estarão limitadas, por absoluta inviabilidade operacional.

Paula Bajer Fernandes Martins da Costa, 34, é procuradora da República e mestre em direito processual pela Universidade de São Paulo.

Luiza Cristina Fonseca Frischeisen, 30, é procuradora da República e procuradora regional dos Direitos do Cidadão em São Paulo.

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