São Paulo, sexta-feira, 13 de dezembro de 1996
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Juiz classista: um voto contra os trabalhadores

ANTONIO CARLOS SPIS

A atual Justiça do Trabalho no Brasil ainda é produto do Estado fascista (corporativo), que tinha como pressuposto a negação da existência do conflito de classes.
Dentro desse princípio, os tribunais trabalhistas atuariam tentando promover a conciliação dos interesses de patrões e empregados.
Quando a conciliação não acontece, vem a intervenção do Estado, com o poder normativo da Justiça do Trabalho, que legisla por meio de sentenças, extrapolando os próprios limites do Judiciário e impedindo a livre negociação coletiva e a democracia.
O verdadeiro Estado democrático, no entanto, é aquele que assimila a existência do conflito de classes e deixa que ele flua dentro dos limites do Estado de Direito.
O que se pretende aqui, portanto, é defender mudanças urgentes na Justiça do Trabalho brasileira, como o fim do poder normativo e também de outras excrescências fascistas, como a figura do juiz classista.
Criado para representar nos julgamentos as diferentes "corporações" existentes na sociedade -a categoria econômica (empresários) e a categoria profissional (empregados)-, o juiz classista, na prática, limita-se a confirmar os votos dos juízes togados em grande parte das vezes.
A razão disso é simples de entender. Trata-se de um vício de origem. Para ser juiz classista, não é necessária formação em direito ou concurso. Basta que um sindicato de patrões ou de empregados o indique ao presidente do tribunal.
O juiz classista tem direito a um mandato de três anos, que pode ser prorrogado ou não pelo magistrado que preside o tribunal.
Assim, fica bastante comprometida a independência do juiz classista, que, na maioria dos casos, teme perder a mamata de um salário que corresponde a 70% dos vencimentos dos juízes togados.
Como se não bastasse tratar-se de um cabide de emprego, o cargo de juiz classista é hoje totalmente inútil, dispensável.
Desde a Constituição de 1988, todo trabalhador tem direito a ser assessorado por um advogado e por seu sindicato ao recorrer à Justiça do Trabalho. E esses assessores jurídicos estão lá para defender os interesses dos trabalhadores, sabendo o momento de buscar a conciliação de interesses ou de insistir no conflito.
O juiz classista, portanto, não tem mais função alguma além de consumir o dinheiro do contribuinte e manter a farsa de que os direitos dos trabalhadores estão sendo respeitados.
Como, historicamente, na maioria dos dissídios coletivos a Justiça defende os interesses dos empregadores, das elites, os juízes classistas que supostamente deveriam zelar pelos direitos dos empregados estão simplesmente baixando a cabeça e dizendo "sim, senhor" aos presidentes dos tribunais.
Segundo recente estudo da Associação Nacional dos Servidores da Justiça do Trabalho, até o ano 2003 um valor correspondente a 100% do atual orçamento do Judiciário trabalhista estará comprometido com a aposentadoria dos juízes classistas (que são dois para cada juiz togado).
Tal gasto é um descalabro, principalmente levando-se em conta a inutilidade e o desserviço que o juiz classista representa.
Nós, trabalhadores cutistas, estamos lutando para acabar com as distorções do Judiciário brasileiro, para garantir a democracia nas relações de trabalho e a eficiência da Justiça.
Hoje, os processos trabalhistas levam, em média, cinco anos e dez meses para serem concluídos. Com isso, as decisões judiciais se tornam quase sempre ineficazes. Apenas iludem o trabalhador. Ele receberá as indenizações a que tem direito totalmente defasadas, após anos de desgastes e prejuízos.
Fica muito confortável e barato para o empregador brasileiro burlar as leis trabalhistas e sonegar seus encargos, ainda mais tendo em mente que a maioria dos trabalhadores não conhece seus direitos nem recorre à Justiça.
Os últimos congressos e plenárias nacionais da CUT deliberaram diversas propostas de mudanças na Justiça do Trabalho, tais como: controle da sociedade sobre a administração do Poder Judiciário; instalação de uma CPI para apurar publicamente irregularidades; fim do poder normativo; extinção do cargo de juiz classista; reforma na organização da Justiça Trabalhista e nos critérios de nomeação de juízes etc.

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