São Paulo, sábado, 14 de dezembro de 1996
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Gardiner faz leitura histórica da 'Nona Sinfonia' de Beethoven

LUIS S. KRAUSZ
ESPECIAL PARA A FOLHA

As interpretações históricas de compositores do classicismo já se tornaram uma tradição em nossos dias. A tendência de executar obras de Haydn, Mozart e seus predecessores em instrumentos de época foi inaugurada por Nicholaus Harnoncourt, na década de 60, e atraiu inúmeros seguidores.
Um dos grupos mais famosos nessa linha é hoje a Academy of Ancient Music, dirigida por Christopher Hogwood, um dos maiores sucessos do mercado fonográfico.
O regente inglês John Eliot Gardiner resolveu levar essa mesma linha interpretativa ao repertório romântico, começando por aquele que iniciou a transição entre estes dois períodos da música erudita: Ludwig van Beethoven.
Fundou, em 1990, a Orchestre Révolutionnaire et Romantique, e desde então vem conquistando um espaço crescente.
Sua versão difere das leituras "modernas", consagradas por Karajan, Wand e Abbado, em primeiro lugar pela sonoridade dos instrumentos do século 19, distinta da dos atuais.
Gardiner supõe que, à época de Beethoven, não existissem cordas recobertas com metal, como as que se usam nas orquestras de hoje. Os violinos, violas, cellos e baixos da Orchestre Révolutionnaire el Romantique usam, exclusivamente, cordas tripa, cujo som é bem menos brilhante -às vezes até um pouco rouco-, mais profundo e menos penetrante.
O mesmo acontece com os sopros, em que a sonoridade metálica está praticamente ausente. Se nas sinfônicas modernas os limites entre metais, sopros, cordas e percussão ficaram atenuados pelo brilho que as técnicas modernas conferem a seus sons, o resultado é aqui uma distinção mais claramente perceptível entre esses diferentes grupos da orquestra.
À sonoridade revolucionária soma-se a segunda grande diferença: o andamento. Gardiner toma os tempos das partituras de maneira espantosamente literal.
Os membros da Orchestre Révolutionnaire et Romantique são, sem exceção, virtuoses. Do contrário, simplesmente não conseguiriam satisfazer as exigências do acrobático Gardiner.
O maestro retoma, em sua leitura, elementos do classicismo que haviam sido praticamente expurgados da obra de Beethoven por gerações de regentes fascinados por Liszt, Wagner e Strauss.
O Beethoven revolucionário de Gardiner convence e agrada não por seu conteúdo intelectual, mas pelo impacto, pela riqueza e profundidade de sua coloração sonora e pelo que contém de genuíno entusiasmo. E é com essa substância, afinal, que se faz música.

Disco: Beethoven - Sinfonia Nº 9
Com: Orchestre Révolutionnaire et Romantique; regência de John Elliot Gardiner
Lançamento: Deutsche Gramophon (importado)
Quanto: R$ 28, em média

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