São Paulo, sábado, 14 de dezembro de 1996 |
Texto Anterior |
Próximo Texto |
Índice
A Vale do Rio Doce _aspectos éticos
LUCIANO MENDES DE ALMEIDA Nas últimas semanas, o tema tem merecido maior atenção nos grupos de estudo e meios de comunicação social. Percebe-se que são numerosos os brasileiros que, sem vantagens pessoais e levados somente pelo patriotismo, oferecem forte resistência à privatização da Companhia Vale do Rio Doce. O assunto requer um tempo de discernimento mais amplo e precedido de debate aberto.Não poucos brasileiros, e incluo-me entre eles, embora aceitem a tese de que a privatização de empresas estatais seja aceitável e, às vezes, conveniente, à luz do princípio de subsidiariedade, contudo, opõem-se a privatizar a Vale do Rio Doce. Além dos aspectos técnicos que apresentam dados preciosos para a discussão, é prioritária a consideração das exigências éticas. Trata-se, com efeito, de uma empresa cuja atividade principal é a exploração do solo e subsolo nacional. Ora, não é razoável decidir sobre a privatização sem estabelecer, com clareza, os limites da lavra desses minérios e os direitos a serem ou não concedidos sobre a descoberta de novas jazidas. Na hipótese, que não parece justificada, da cessão de uso a empresas não brasileiras, é preciso conhecer quais os riscos para o país de perder a decisão sobre suas jazidas. Mais grave seria a opção de uma empresa internacional de reduzir a exploração de nosso minério em benefício dos interesses de outros grupos. Não se compreende como proceder à privatização da Vale sem estabelecer com a devida exatidão a riqueza das jazidas que se encontram em sua área. Ninguém pode alienar um patrimônio nacional sem antes conhecer seu verdadeiro valor. Não é moralmente aceitável que administradores do bem público privem o povo do que lhes pertence, sem assegurar a justiça da transação. A argumentação dos que se inclinam para a privatização da Vale insiste em que se obtenha um rendimento maior para os cofres públicos. Até hoje a Vale fez investimentos diversificando seu campo de trabalho, com aprovação do governo, ao qual pertence a orientação das empresas estatais. Qualquer decisão precipitada em matéria de tão evidente interesse nacional não se justifica à luz do critério ético. Daí a necessidade de levar adiante um estudo exaustivo, em que os técnicos cheguem a um consenso que convença a população. Não é pois razoável a insistência em acelerar uma decisão cujas premissas não estão suficientemente provadas. A eventual terceirização dos serviços de lavra poderia ser analisada desde que seja garantida a propriedade e a fiscalização do Estado, de modo a salvaguardar a finalidade dos bens destinados a todos, uma vez que sobre eles pesa sempre uma hipoteca social. No momento em que o país procura acertar seus caminhos econômicos e investir mais no social, torna-se indispensável proceder com prudência, para não lesar decisões futuras em favor do desenvolvimento nacional. Renovo a confiança em Deus, pedindo luzes para nossos administradores públicos, a fim de que zelem pelo patrimônio brasileiro, sem ceder à miragem de benefícios imediatos. D. Luciano Mendes de Almeida escreve aos sábados nesta coluna. Texto Anterior: A nocividade da CPI Próximo Texto: Reação das exportações exige tempo Índice |
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress. |