São Paulo, domingo, 29 de dezembro de 1996
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Uma revolução silenciosa

FERNANDO HENRIQUE CARDOSO

Trinta meses de Plano Real e dois anos de governo permitiram uma revolução silenciosa no Brasil, dentro de um clima de liberdade e transparência. Os primeiros resultados estão começando a aparecer.
Tudo começou com a estabilização da economia. Durante a campanha eleitoral, explicando o plano econômico, eu dizia que a inflação era o imposto mais perverso que os brasileiros podiam pagar. A inflação destruía a esperança, corroía o tecido social e incentivava a esperteza e a corrupção. Os ricos corriam para a especulação financeira. A classe média se socorria da poupança, que apenas atualizava monetariamente suas economias. Só os pobres não tinham como se defender.
No entanto, governar não é apenas estabilizar a economia. Uma moeda forte não é um fim em si mesmo. Governar é, antes de mais nada, promover a justiça, a igualdade de oportunidades, a distribuição de renda, a geração de emprego, melhorar a qualidade de vida e garantir a felicidade.
O Brasil do abandono, do atraso, da desesperança e da necessidade já pode sonhar com um Brasil de justiça, de progresso, de solidariedade.
Nestes dois anos, tivemos avanços reais -insuficientes, mas reais- e que alimentam a nossa confiança nas mudanças.
Já temos dois anos de inflação em baixa. Em 1996, ela deve ficar em 10%. Em outros tempos, isso seria a inflação de uma semana. São evidentes também os sinais de que a estabilização da economia permite uma mudança na distribuição de renda e na melhoria da qualidade de vida.
A exclusão social começa a dar lugar à inclusão social. Treze milhões de brasileiros já deixaram a linha da pobreza. As classes D e E diminuíram 17%, e as classes A e B cresceram 21%. O rendimento dos 10% mais pobres da população dobrou.
Isso permitiu que o frango se tornasse um símbolo do sucesso do Real. Mais do que isso, a explosão de consumo desse produto indicou que parte considerável da população passou a consumir proteína animal e a ter uma melhor qualidade de vida. Carne bovina, ovos, congelados, iogurte e conservas passaram a frequentar mais a mesa dos brasileiros. As classes D e E já são responsáveis por 30% do consumo de produtos como biscoitos, iogurtes e macarrão instantâneo.
Aumentou também o número de residências com geladeira, TV em cores, freezer, produtos eletroeletrônicos e eletrodomésticos. Os mais pobres começam também a ter acesso a aparelhos de CD e TV a cabo.
Mais do que o acesso a bens e serviços até agora inatingíveis, os brasileiros passam a fazer uso dos seus direitos de cidadania. O direito à moradia é um deles. As vendas de cimento cresceram 12% em 1995 e 21,5% no primeiro semestre deste ano. Estudos indicam que mais da metade da produção do ano passado foi utilizada por pessoas que construíram sozinhas suas casas. Os brasileiros estão passando a ter uma moradia mais digna.
Os que reclamam do desemprego e da recessão deveriam ver melhor os índices da economia. O Brasil registrou em maio último o maior consumo de gasolina de sua história. Cresceu também o uso de energia elétrica, assim como a importação de máquinas e equipamentos (230% nos dois últimos anos).
Nestes dois anos de governo, 100 mil novas famílias tiveram acesso à terra, em estrito cumprimento das metas do governo para a reforma agrária. Até o final do governo, serão 280 mil. Já desapropriamos, neste período, 3 milhões de hectares. Com a recente aprovação da MP que aumentou o ITR, a posse de terra improdutiva não será mais um negócio rentável. Ao contrário.
Na Previdência Social, o aumento real médio dos benefícios foi de 39% entre 94 e 96, com uma moeda já estável. Só neste ano, a Previdência incorporou 710 mil novos beneficiários. Ela atende também, agora, 280 mil deficientes, 40 mil idosos e 340 mil crianças e adolescentes. Isso é dar renda a quem não tinha renda até agora.
Conseguimos reduzir, de maneira sensível, os índices de mortalidade infantil, um fato reconhecido pela Pastoral da Criança.
Tenho muito claro que tudo isso, como já disse, são avanços reais, mas insuficientes. No entanto, meu governo tem apenas dois anos, e o Brasil luta há séculos contra o atraso, a desesperança e o abandono.
Meu compromisso de governo é -para usar a expressão da filosofia da Grécia Antiga- com a construção da felicidade do povo brasileiro. Esse sonho está em nossas mãos. Vamos construí-lo juntos. Nossos filhos merecem isso.

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