São Paulo, quarta-feira, 14 de fevereiro de 1996
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Sobre o (des)prestígio do Congresso Nacional

PEDRO SIMON

A Folha (29/1/96) publicou resultado de pesquisa de opinião sobre o grau de prestígio e poder de 12 instituições brasileiras. Os números são auto-explicativos, mas, mesmo assim, merecem uma reflexão mais profunda, à medida que refletem o pensamento da população brasileira sobre suas instituições e sua representação política.
Pode-se mesmo dizer que se trata de um retrato de como a população percebe e avalia a institucionalização de seu dia-a-dia, dada a abrangência da pesquisa, que inclui todos os aspectos da vida do cidadão, como a religião, o esporte, os poderes constituídos, a defesa da cidadania e da soberania e a representação profissional e política.
Considerada essa abrangência, uma primeira observação que os números não escondem é que, na percepção da sociedade brasileira, o país vive uma crise institucional, à medida que, das 11 instituições incluídas na pesquisa, apenas três obtiveram percentual acima de 50%: a imprensa, os clubes de futebol e a Igreja Católica. Ou seja, só essas três instituições mantêm prestígio na opinião da maioria da população.
Mas o que chama atenção nos resultados da pesquisa são algumas posições relativas no "ranking" institucional. Para a população a imprensa tem mais poder que as Forças Armadas. Ou o Poder Judiciário, embora o nome seja menos poderoso que o dos clubes de futebol que, por sua vez, têm mais prestígio que a Presidência da República e os ministros de Estado, que também perdem para os bancos e as financeiras.
Mais ainda: o porte de estatais como Petrobrás, Vale do Rio Doce, Eletrobrás ou Telebrás não é suficiente para que a população as considere com maior poder que o Flamengo, o Corinthians, o Vasco da Gama etc.
Não se considerou, até aqui, o Congresso Nacional e os partidos políticos. Longe de se cometer premeditadamente o pecado da omissão. Pelo contrário, é que os resultados da pesquisa, no que se refere ao que a população percebe sobre sua representação política e partidária, merecem destaque especial.
Para o povo, que elege senadores e deputados federais como seus representantes, o Congresso e os partidos carregam a lanterna no "ranking" do prestígio das instituições. Metade da população considera que o Congresso ainda mantém poder, mas não tem prestígio para três em cada quatro brasileiros.
Embora repetitivo, para ser enfático, há que se refletir sobre a constatação de que a população brasileira considera o Congresso Nacional e os partidos políticos com menos prestígio, pela ordem, que a imprensa, os clubes de futebol, a Igreja Católica, as Forças Armadas, os bancos e financeiras, a Presidência da República e os ministros de Estado, o Poder Judiciário, os sindicatos, as empresas estatais e até a Igreja Universal do Reino de Deus.
Mais ainda: tamanho desprestígio ocorre exatamente no momento em que esse mesmo Congresso se reveste do poder de Assembléia Constituinte, ao propiciar mudanças importantes na Constituição, como a quebra de monopólios e as reformas administrativa, previdenciária, fiscal e tributária, e que discute volumes de recursos com elevados custos de oportunidade, como o empréstimo externo para a implantação do Sivam. Ou seja, a população ainda considera com menor prestígio uma instituição cujos integrantes formulam e alteram a mais importante de suas leis do que outra cujo representante agride o seu mais importante símbolo religioso. Haja reflexão!
Para as cinco maiores capitais brasileiras a pesquisa mostra resultados obtidos em três momentos: março de 1987, outubro de 1992 e dezembro de 1995. Como era de se esperar, o Congresso obteve maiores percentuais, em termos de poder e prestígio, em 1992, exatamente no momento em que promoveu as investigações que culminaram no "impeachment" de Fernando Collor.
Isso retrata um dos papéis fundamentais que a população espera ser desempenhado por seus representantes no Parlamento: a constante vigilância da probidade na alocação de recursos públicos. Mais do que isso: mostra o repúdio da população à corrupção e à dilapidação do patrimônio público. Daquele momento até hoje a Presidência da República recuperou poder e prestígio, enquanto o Congresso Nacional e os partidos políticos perderam espaço na opinião dos brasileiros e brasileiras.
Há muito que se refletir sobre esses fatos. Se é grave a observação de que há, aos olhos da população, crise institucional, é particularmente preocupante a crise de legitimidade do Congresso e dos partidos políticos. E parece não haver desinformação ou falta de comunicação com a população como um todo.
O Congresso e a imprensa encontram-se em pólos distintos na pesquisa. Se os meios de comunicação possuem tamanha legitimidade popular e povoam plenários, corredores e gabinetes divulgando informações sobre o dia-a-dia do Parlamento e se este é o momento em que se altera profundamente a legislação do país, era de se esperar que o Congresso obtivesse melhor performance na avaliação popular.
Pior que o resultado da pesquisa da Folha é ela permanecer silenciosa, na página 1-8 da edição de 29 de janeiro. Há que se refletir que tais números são reflexo de uma situação que deve ser urgentemente repensada. Aliás, em se tratando de Congresso, talvez o melhor termo não seja repensar, mas, antes, resgatar. Aqui se viveram momentos históricos. Biografias não lhe faltam. Basta recorrer à memória de figuras e exemplos como Ulysses Guimarães, Tancredo Neves, Teotônio Vilela, Alberto Pasqualini, entre outros.

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