São Paulo, quarta-feira, 28 de fevereiro de 1996
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Velhos e felizes

GILBERTO DIMENSTEIN

Ao investigar o medo dos brasileiros, pesquisa ainda inédita da agência Saldiva & Associados encontrou um temor sobre a velhice que revela um misto de preconceito, injustiça e desinformação -algo que descobertas nos EUA ajudam, agora, a destruir.
Depois dos 35 anos, segundo a imensa maioria dos entrevistados, o brasileiro é "velho" para o mercado de trabalho; a partir daí, entra na rota da marginalização, com mais dificuldades para achar emprego ou progredir na profissão.
O desemprego, portanto, torna-se mais devastador combinado com a velhice. Se tiver o mesmo destino da maioria dos brasileiros, o aposentado vai ganhar dois salários mínimos por mês, 20 vezes menos do que qualquer motorista de táxi em Nova York.
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Os EUA dão, porém, uma ótima notícia aos brasileiros. Apoiado nas universidades, o governo americano pesquisa todos os anos a saúde dos homens e mulheres acima dos 65 anos.
As estatísticas mostram que o indivíduo envelhece com cada vez mais alegria e capacidade de trabalho -portanto, menos dependente.
"A mistura de ciência com educação muda o conceito do que é ser velho", diz o bioquímico Fernando Reinarch, professor da Universidade de Medicina de Cornell (uma das dez melhores dos Estados Unidos) e da USP. "Além dos remédios, as pessoas se cuidam mais, cortam o cigarro, fazem dieta, ginástica", acrescenta.
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Natural, portanto, que diminuam várias doenças. De 1960 a 1990, os derrames e ataques cardíacos, para cada 100 mil habitantes, tiveram queda respectivamente de 65% e de 47%.
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Segundo Reinarch, há uma relação direta entre saúde e emprego; quanto mais tempo um indivíduo trabalha, mais retarda o envelhecimento mental. É como se o cérebro fosse um músculo que necessitasse ser exercitado.
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Temos um ótimo exemplo contra os preconceitos. Fernando Henrique Cardoso só conseguiu fazer algo de fato importante aos 63 anos, quando lançou o Plano Real. Fosse pedir emprego para gerente de qualquer empresa, seria fatalmente rejeitado.
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O governador Jaime Lerner (PR) não é médico, apenas urbanista, mas tem uma receita para os paulistanos ganharem oito anos. "Mudem-se para Curitiba", brincou na semana passada em Nova York; ele é um dos assessores da ONU para a reunião sobre as cidades a ser realizada na Turquia.
Segundo seus cálculos, o paulistano perde, em média, três horas por dia no trânsito -o que dá 93 horas por mês, totalizando 46 dias por ano.
Explica: "Como o paulistano vive cerca de 70 anos em média, vai ter desperdiçado pelo menos 8 anos no trânsito, o que ganharia em Curitiba".
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Os números da saúde vão melhorar ainda mais quando (e se) for dizimada a indústria do fumo. Veja a informação de um estudo divulgado em conjunto pelas associações médicas americanas do câncer e do coração. Comparadas as possibilidades de morte.
Acidente aéreo: 1 em 815 mil.
Salto de pára-quedas: 1 em 96.296.
Acidente de carro: 1 em 143.
Cigarro: 1 em 5.
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PS - Não vou entrar na discussão legal, mas está correta a decisão da Prefeitura de São Paulo de copiar o exemplo de Nova York e atacar o cigarro nos restaurantes.

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