São Paulo, domingo, 3 de março de 1996
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Governo secreto

ALOYSIO BIONDI
Um "regime secreto" de governo foi implantado -oficialmente- no Brasil, em setembro do ano passado. Por meio de simples portaria, o governo FHC decretou que decisões do Conselho Monetário Nacional e Banco Central não mais seriam publicadas no "Diário Oficial", isto é, passavam a ser sigilosas -e nem mesmo os ministros fora da área econômica poderiam conhecê-las.
O dólar vai ser valorizado ou desvalorizado nos próximos meses? Os juros vão subir ou cair? Os títulos da dívida externa vão valer mais? Vai haver socorro aos usineiros ou não? O rombo dos bancos vai ser coberto? E o crediário, vai ser facilitado ou arrochado ainda mais? Tudo "sigiloso".
Nem os empresários, nem a classe média, nem o povão, nem o Congresso: toda a sociedade perdeu o direito de saber os próprios rumos da economia (e não apenas do mercado financeiro), escolhidos pela equipe econômica.
Esse caso inédito de autoritarismo no mundo, e que nem a ditadura ousou adotar no Brasil, foi revelado por esta Folha em outubro. Inacreditavelmente, não houve reação alguma, nem do Congresso, nem de entidades como a OAB, nem de entidades sindicais. Sinal verde para novas arbitrariedades.
Em novembro, coincidentemente, surgiu o Proer, programa de socorro a bancos. Ao mesmo tempo, o Banco Central, sem dar satisfações a ninguém, adotava os incríveis planos de "venda" do Econômico e do Nacional, pelos quais o Tesouro (os contribuintes) ficará responsável pela parte "podre" e os "compradores" ganham a parte lucrativa. Nunca se viu isso em país algum.
Moral da história: os escândalos do Nacional e do Econômico não são produto apenas da conivência de governantes. Mais do que isso, eles só têm sido possíveis porque Congresso e opinião pública têm ficado impassíveis diante do comportamento autoritário do Executivo, de equipes econômicas -com o auge no governo FHC.
Não basta, por isso, investigar a fundo as "quebras" recentes. A mudança fundamental para a sociedade brasileira é outra: o Congresso precisa retomar suas funções, que o Planalto vem usurpando.
Primeiríssima providência para "virar o jogo": aprovar com urgência o projeto que reduz o uso de medidas provisórias, com as quais o governo FHC cria fatos consumados.
Sem doações - O governo vai privatizar o Meridional. O banco nasceu há alguns anos, enfrentando o "rombo" de suas instituições, que estavam quebradas. Houve tempo para a recuperação. O mesmo pode ser feito como o Econômico e o Nacional. Sem doação de partes "boas", bilhões de reais, a outros bancos.
Caminho - O Banco do Brasil busca receitas em áreas novas. Vendeu meio milhão de títulos de capitalização, batendo recordes. Ultrapassou a meta de vendas de planos de previdência complementar (mais 169%, contra 100% previstos).
O mercado oferece oportunidade de recuperação a qualquer banco. Chame-se ele BB, Banespa, Econômico ou Nacional. Se não houver a doação de partes "boas", claro.
Catastrofista? - Agora, o IBGE admite que o desemprego deu saltos no país. Em janeiro, o número oficial é 5,26%, contra 4,44% em dezembro. Sobram desempregados, e não apenas em São Paulo, como a equipe FHC dizia. Em Salvador, o desemprego chega a 17%. Em Belo Horizonte, a 12%.

Aloysio Biondi, 59, é jornalista econômico. Foi editor de Economia da Folha e diretor de Redação da revista "Visão". Escreve neste espaço aos domingos e, às terças e quintas, na página 2 do caderno Dinheiro.

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