São Paulo, domingo, 17 de março de 1996
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Real não é a causa da crise

GILSON SCHWARTZ
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Tanto se falou que os bancos iriam sofrer com o fim da superinflação que, meses depois do Plano Real, virou moeda corrente explicar a crise bancária como fruto da estabilização. Essa tese pode até parecer simples e convincente, mas é falsa.
Em primeiro lugar, sofrer não é sinônimo de quebrar. Havia de fato "gordura" no sistema financeiro. Mas é um exagero dizer que fazer regime é uma forma de suicídio.
É também incorreto dizer que todos os países onde houve estabilização ocorreu uma crise bancária. A "mãe de todas as estabilizações" recentes, o Plano Shekel de Israel lançado em 1985, não gerou quebradeira.
Entre os ingredientes do sucesso, fez-se um ajuste fiscal forte, contando até com o alongamento de aplicações financeiras. Afinal, como seria possível apostar na estabilidade se o governo continuasse deficitário e a ciranda financeira ativa?
Na América Latina, algumas das principais crises bancárias recentes aconteceram sem nenhuma relação com planos de estabilização. Houve uma onda no início dos anos 80, com crises graves no Chile, no México e na Argentina, cuja origem foi a crise da dívida externa.
E a grave crise bancária argentina do ano passado (ou seja, quatro anos depois do Plano Cavallo) teve origem também no aperto externo e não em algum misterioso vírus destruidor de bancos que resultasse da estabilidade de preços.
Em outubro do ano passado, um seminário do Banco Interamericano de Desenvolvimento apontou, entre outras coisas, fatores macroeconômicos mais ameaçadores, como a "volatilidade fiscal" e os "booms creditícios".
Esses dois fatores estiveram muito presentes na economia brasileira desde o início do Plano Real, mas têm muito pouco a ver com estabilidade de preços e muitíssimo a ver com opções políticas e eleitorais feitas pelo governo.
A "estabilização" não pode servir de álibi para inocentar autoridades que fizeram algumas opções erradas, na hora errada.

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