São Paulo, domingo, 31 de março de 1996
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Até economistas podem perceber o óbvio

MARCOS AUGUSTO GONÇALVES
EDITOR DE DOMINGO

É compreensível o predomínio da economia na cena brasileira, como é evidente que o golpe contra a inflação aplicado pelo Real deve ser consolidado e mobilizar energias e atenções do governo e da sociedade.
Mas é verdade também que a estabilidade dos preços não é, por si só, sinal de desenvolvimento, e a vida das pessoas, com suas desigualdades e necessidades, não se resume à inflação controlada.
Há, no entanto, em curso no Brasil, uma sufocante monopolização da agenda pelo Real, pelo controle da inflação, pela estabilidade da moeda.
O economicismo do governo rivaliza com o de setores da mídia, que acham que nada tem importância, tudo é subalterno quando se trata da estabilização.
Calem-se os que criticam o fisiologismo e querem a mudar a cultura política, calem-se os que consideram razoável que o Congresso investigue o sistema financeiro, calem-se os que se preocupam com temas sociais, distribuição da renda e miséria -valor mais alto se alevanta, meus filhos, não atrapalhem o trabalho do papai.
No economicismo em voga, tenta-se desqualificar qualquer demanda que possa arranhar o plano que todos parecem ter na cabeça, único projeto capaz de ajudar o país -sem o que, nada pode ser feito, pensado, dito.
Mas, felizmente, até mesmo entre economistas, o óbvio pode ser percebido. Caso do norte-americano Rudiger Dornbusch, na entrevista que concedeu a Celso Pinto, publicada nesta edição.
E o óbvio é que o governo e seus assessores de imprensa concentram todas as atenções no combate à inflação, como se o país devesse servir ao Real e não o Real ao país. Tudo subordina-se a esse objetivo -que ainda rende bons índices de popularidade e é, evidentemente, um trunfo para a reeleição.
"Falta uma visão do que fazer com o Brasil", fala Dornbusch, que aponta a pouca imaginação de Brasília e diz que o presidente parece ter esquecido a razão pela qual está na Presidência: desenvolver um projeto nacional para um país que precisa sair da pobreza, corrigir desigualdades, crescer e avançar.

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