São Paulo, domingo, 31 de março de 1996
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Dornbusch e o mundo

CELSO PINTO

Em 1993, quando o FMI, o Banco Mundial, os principais bancos e economistas internacionais idolatravam o México, um economista de peso ousou ficar na contramão e previu um colapso iminente: Rudiger Dornbusch. Um ano depois, o México desintegrou e a reputação de Dornbusch, considerado um dos mais importantes economistas contemporâneos, cresceu ainda mais.
Nesta semana, Dornbusch, professor do Massachussets Institute of Technology (MIT), esteve em São Paulo para dar uma palestra a clientes do Banco Garantia. Traçou o panorama da economia mundial e latino-americana que se segue.
Brasil: Não está às vésperas de uma crise, mas chegará nela, se não corrigir sua rota econômica. Derrubou a inflação, mas não fez o ajuste fiscal e de Estado necessário. Ao contrário, está se endividando perigosamente e empurrando os problemas com a barriga.
A receita: deixar de lado a obsessão de derrubar ainda mais a inflação e lançar um projeto nacional que, em nome da área social, possa fazer o ajuste fiscal. Com o projeto na rua, seria possível acelerar a desvalorização cambial, indexar o câmbio, aceitar uma inflação um pouco maior e ter mais crescimento. O mínimo que ele considera aceitável para o Brasil é 7% ao ano.
México: Está retomando lentamente o crescimento puxado pelas exportações, mas tem graves problemas pela frente. O ajuste depois de 94 deixou um enorme passivo nos bancos e nas empresas que o governo insiste em absorver.
Com isso, não há dinheiro para a infra-estrutura e a área social, e cresce a tensão política. Depois da dramática desvalorização no ano passado, o câmbio está num bom nível, mas há pressões que podem levá-lo novamente a uma sobrevalorização.
De um lado, a obsessão do BC mexicano com a inflação baixa. De outro, o desejo do presidente americano, Bill Clinton, de contar com a estabilidade no México para ajudar sua reeleição.
"Não há perspectivas positivas este ano, nem no próximo -e ninguém consegue enxergar além disso", diz Dornbusch.
Argentina: Avançou muito nas reformas, mas entalou na sobrevalorização cambial. A única forma de acelerar o crescimento é "dar um retorno obsceno aos exportadores". Para isso, tem três opções, todas difíceis.
Um reajuste cambial seria desastroso: a inflação dispararia e viria uma gigantesca crise. Outra opção seria ter paciência e continuar ganhando produtividade. Isso, contudo, prolongaria o baixo crescimento e aumentaria a tensão política já existente entre o presidente Menem e seu ministro da Fazenda, Domingo Cavallo.
Uma terceira saída, sugerida por Dornbusch: cortar a taxação ainda existente sobre o trabalho, o que reduziria o custo da mão-de-obra, sem precisar de desvalorização. Para contornar o buraco fiscal que surgiria, ele sugere que a Argentina financie externamente o programa. Não é fácil de vender, mas ele não vê alternativa.
Chile: Dez anos de crescimento a 7% ao ano, com baixa inflação, tornam o país um modelo. O único problema é que a macroeconomia ficou muito chata: dá tudo certo.
Estados Unidos: Baixa inflação, crescimento razoável e nenhum grande obstáculo à frente. Só entrará em recessão por acaso e, se isso acontecer, o FED (banco central) pode cortar os juros de 5% para zero e resolver o problema.
O panorama não muda, haja reeleição de Clinton ou eleição de Robert Dole. A única ameaça é uma eventual correção da bolsa americana. Neste caso, todo mundo, inclusive o Brasil, sofreria bastante com a debandada de investidores.
Europa: Está estagnada pela obsessão em ter uma moeda comum e a situação não vai mudar nem se, eventualmente, esta moeda for criada. A perspectiva é recessão, alto desemprego e altos juros.
Japão: Pela primeira vez, depois de três ou quatro anos, está voltando a crescer um pouco. Pode não durar: é preciso aumentar o imposto sobre consumo de 3 para 5% e, se isso acontecer, a economia esfria. Se não acontecer, também há riscos pelo lado fiscal. A obsessão do governo em salvar os bancos não ajuda em nada.

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