São Paulo, domingo, 31 de março de 1996 |
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Carne ilegal domina 60% do mercado Produto não tem inspeção MARIO CESAR CARVALHO
Uma nuvem de moscas sobrevoa o animal logo que começa a esfola. Uma hora e meia depois, o bicho está dividido em quartos traseiros e dianteiros, pronto para ir ao açougue. A distribuição tem de ser feita a jato. Não há frigorífico e a carne pode começar a se deteriorar. Cerca de 60% da carne bovina consumida no Estado de São Paulo passa por esse ritual medieval presenciado pela Folha. Não há inspeção sanitária -análise feita em 38 pontos do boi, no mínimo, para detectar doenças que podem ser transmitidas ao homem. A estimativa é da delegacia do Ministério da Agricultura em São Paulo. No país, a média de carne fora-da-lei é um pouco menor -em torno de 50%. Carne clandestina pode causar desde intoxicação alimentar até neurocisticercose -palavrão científico que designa a infestação do cérebro por larvas da solitária, afetando a visão, a audição e provocando até a loucura. A cisticercose é a principal doença do gado em São Paulo. Atingiu 110.105 reses no ano passado -4,18% das que passaram pelo SIF (Serviço de Inspeção Federal). É por isso que a venda de carne sem controle nos EUA e Europa é punida com prisão. No Brasil, muitos matadouros clandestinos já foram fechados, mas em geral a carne fora-da-lei é tolerada. Meia dúzia de números ilustram as consequências dessa política: Em 1975, 73,9% dos bovinos abatidos no país passavam pelo controle sanitário. Hoje, só a metade recebe o carimbo do SIF. Existem no Estado de São Paulo cerca de 400 matadouros municipais. Só seis têm condições de higiene de operar, segundo a Secretaria Estadual da Agricultura. "A situação da carne é vergonhosa, porque o Brasil já teve um serviço de inspeção de Primeiro Mundo. Se a população soubesse o que está comendo, ficaria estarrecida", afirma José Christovam Santos, 69, professor aposentado da Faculdade de Engenharia de Alimentos da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) e chefe do SIF durante 15 anos. O serviço de Primeiro Mundo vigorou nos anos 70. O Ministério da Agricultura, empurrado pela idéia de "Brasil Grande" e de olho nas exportações, fechou centenas de matadouros. A FAO, órgão das Nações Unidas para alimentação, considerava o SIF exemplar. LEIA MAIS sobre carne clandestina nas págs. 3-2 a 3-8 Próximo Texto: Descentralização provocou o descontrole Índice |
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