São Paulo, domingo, 14 de abril de 1996
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Tráfico nova-iorquino chega à Internet

GILBERTO DIMENSTEIN
e PATRICIA DECIA

GILBERTO DIMENSTEIN; PATRICIA DECIA
DE NOVA YORK

Endereços eletrônicos, cartões de visita, bips e venda de porta em porta são 'métodos' de vendedores

O tráfico de drogas entrou no ciberespaço. A Internet, a rede mundial de computadores, funciona hoje como um dos meios de encomendar, com pouco ou quase nenhum risco, qualquer tipo de droga em Nova York.
O caminho é simples. Utilizando uma senha, o consumidor manda uma mensagem ao traficante por meio do correio eletrônico, estabelece a quantidade e, em pouco tempo, recebe a mercadoria em sua porta.
A sofisticação tecnológica da informática foi um dos meios criado para driblar a polícia, que, só no ano passado, realizou 87 mil prisões de vendedores e consumidores, o que corresponde a 27% de todas as detenções na cidade.
Nova York gasta US$ 7 bilhões ao ano com tratamento, prevenção, repressão e perda de produtividade de mão-de-obra ligada ao uso de drogas. O dado é conclusão de um estudo do "Center on Addiction and Substance Abuse", da Universidade de Columbia.
O prefeito Rudolph Giuliani diz que "não se combate criminalidade sem combater as drogas". Apesar dos esforços da polícia, ainda é fácil comprar drogas em Nova York. A repressão não consegue acabar com a lei da oferta e da procura na cidade, com seus 7 milhões de habitantes e um PIB de US$ 250 bilhões -quase metade do PIB do Brasil, onde a população é de 150 milhões. Segundo dados oficiais, há pelo menos 490 mil viciados.
A classe média, que não quer se expor, também recorre a vendedores que usam os aparelhos de bip (números telefônicos nos quais você deixa mensagem gravada, sem telefonistas).
"Até pouco tempo atrás, só usavam bip na cidade médicos, altos executivos e traficantes. Se estivesse mal-vestido, podia apostar que não era nem médico nem executivo", diz Robert Hammel, que foi promotor e processou traficantes em Nova York. Hoje ele é uma espécie de ombudsman para direitos humanos da prefeitura da cidade.
As semelhanças com os executivos não param por aí. Para divulgar o número do bip, os traficantes chegam a distribuir cartões. A Folha teve acesso a um deles, que trazia quatro números de telefone, uma para cada região da cidade.
O interessado liga e deixa mensagem gravada. Imediatamente, recebe uma chamada do traficante para combinar quantidade e preço. Demora 20 minutos.
As facilidades não param por aí. Eduardo Torreão, um brasileiro que mora há dez anos em Nova York, presenciou a seguinte cena.
Estava numa festa, numa das regiões nobres da cidade, quando a campainha soou. Era um homem alto, bem-vestido, carregando uma valise de couro. Dentro da mala, havia vários tipos de drogas.
"Ele tinha maconha, cocaína e heroína de vários países. E, se as pessoas tivessem dúvidas sobre o que escolher, ele explicava todas as características e os efeitos, como faria qualquer bom vendedor."

LEIA MAIS sobre drogas nos EUA nas págs. 19 e 20

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