São Paulo, domingo, 14 de abril de 1996
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ele só quer jazz, feijoada e caipirinha

Oscar Peterson traz seu ritmo para duas apresentações em São Paulo
"Só há dois tipos de jazz: bom e ruim. Rótulos não dizem nada."
por Ana Ban
Aos 70 anos, o pianista canadense Oscar Peterson produz um CD-ROM sobre sua arte e se prepara para vir, pela quinta vez, ao Brasil -nos dias 19 e 23, seu quarteto se apresenta no teatro Municipal de São Paulo. Fã de Jorge Ben Jor e João Gilberto, ele está ansioso para saborear uma velha conhecida: a feijoada.
Peterson falou à Revista da Folha por telefone, de seu escritório em Mississauga (Canadá). Leia, abaixo, trechos da entrevista.

Este é a quinta vez que o senhor vem ao Brasil. Gosta tanto do país?
Amo as pessoas e a música. Também adoro a comida, sou amante de feijoada. Quero beber caipirinha, mas meu médico não pode saber.
O que lembra daqui?
Do entusiasmo da platéia, do modo como as pessoas reagem à música.
Como será a próxima visita?
Não sei bem, mas espero fazer concertos maravilhosos. Estou ansioso para ir ao Brasil, já faz muito tempo que estive aí. Provavelmente, será o ponto mais alto do ano. Depois, devo tocar na Europa: Montreux, Londres, Paris...
E os shows?
Nós selecionamos algumas melodias e tocamos tudo. Não lidamos com a reação da platéia.
Conhece música brasileira?
Sou fã de Jorge Ben (Jor), João Gilberto, Tom Jobim. Gosto muito das canções famosas na América, como "Garota de Ipanema".
Vai tocar alguma delas?
Isso é segredo.
Fale sobre o seu quarteto.
O baterista, Martin Drew, é de Londres. Ele toca comigo há uns oito anos. Lorme Lofsky, guitarrista, faz parte do grupo há dois anos. Como eu, ele dá aulas na New York University (em Toronto). Niels Petersen, o baixista, é meu amigo. Acho que ele é o mais talentoso baixista que há. É um grupo bastante internacional.
O senhor gosta de ensinar?
Ainda dou aulas de vez em quando. O prazer de ensinar é ver o aluno crescer, entender o que você quer dizer e se tornar um músico melhor.
Quantos shows faz por ano?
Eu fazia cerca de 200, mas diminui o ritmo por problemas de saúde. Hoje, faço de 15 a 20 shows por ano.
Como escolhe onde ir?
Vou sempre aos lugares dos quais gosto, por isso o Brasil.
O senhor já tocou com grandes nomes do jazz como Ella Fitzgerald, Louis Armstrong etc. O que muda daquela época para agora?
Anos atrás, eu excursionava com a Jazz At The Philarmonic (JATP -conjunto formado no Carneggie Hall, Nova York, nos anos 50). Essas pessoas faziam participações no grupo. No outono, tocávamos nos EUA; na primavera, na Europa. Entre as turnês, cada um formava seu grupo. Hoje tenho que tomar cuidado com a saúde, ensino e componho mais.
Sente falta dos shows ao vivo?
Não. Viajar hoje não é tão confortável como antes.
Ter uma formação em piano clássico ajuda a tocar jazz?
Sim, dá uma base muito sólida.
Nunca pensou em seguir carreira como pianista clássico?
Na verdade, não. Jazz é o que eu amo. Só se pode fazer uma coisa de cada vez para ser realmente bom.
Como foi sua infância?
Meu pai ensinou música a todo mundo em casa. Meu irmão mais velho, Albert, era o melhor pianista da família.
O senhor incentiva seus sete filhos a estudar música?
Nunca os obriguei a tocar porque isso é o que eu faço, não acho que seja certo.
Como nasceu seu interesse por jazz?
Eu ficava acordado, tarde da noite, ouvindo big bands no rádio.
Já pensou em se mudar para os Estados Unidos?
Anos atrás, Count Basie perguntou se eu gostaria de me mudar. Mas, em primeiro lugar, eu amo meu país.
O que gosta de ouvir?
Só música boa, música que não é feita só para ganhar dinheiro, que é feita por amor: Art Tatum, Dizzie Gillespie, Charlie Parker...
E as novas formas de jazz, como o acid jazz, o que acha disso?
Só há dois tipos de jazz: bom e ruim. Rótulos não dizem nada.
Há 20 anos o senhor já dizia que o jazz iria morrer. O que pensa agora?
Hoje, ouvimos muito menos jazz. Acho que a previsão estava certa.
Ainda há algum lugar onde dá para ouvir jazz puro hoje em dia?
É só ir a um dos meus shows!
O senhor se interessa por tecnologia. Ao mesmo tempo, costuma dizer que o piano eletrônico é muito impessoal.
Tudo depende de como você usa o equipamento. Tenho um estúdio em casa, que uso para compor. Também estou trabalhando em um CD-ROM em que vou tocar e descrever o que fiz e como fiz. Mas, para tocar, prefiro o piano acústico. É o meu instrumento, os outros são só enfeite.

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