São Paulo, quarta-feira, 17 de abril de 1996
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Segurança e fantasia

CLAUDIONOR LISBOA

Causam-me profunda preocupação certos equívocos cometidos por ilustres autoridades sobre a segurança pública.
Às vezes chego a imaginá-los produto inconsequente de ensaios arrogantes, praticados por seres insanos, que pugnam por espaços de sucesso, negados naturalmente entre os seus próprios pares durante toda uma vida profissional. Outras vezes -raras vezes, confesso- classifico o seu trabalho como um esforço social relevante, uma voz a clamar por seriedade no trato da coisa pública.
Assim, imbuído das melhores das intenções e infenso a devaneios, gostaria de expor raciocínios que o tempo afoito fez nascer, e a experiência sensata consolidou nos humildes e eloquentes arquivos das minhas horas.
Inicialmente, diria que a segurança pública, como "dever do Estado, direito e responsabilidade de todos", somente poderá ser entendida como um sistema harmônico voltado ao bem-estar social, ao exercício e à defesa da cidadania. Por conseguinte, quanto maior a participação do cidadão, fardado ou não, mais amplo e efetivo se tornará o combate à criminalidade.
Há certos conceitos elementares que precisam, "ab initio", ser compreendidos, evitando-se a prevalência de paixões e crendices. Assim, urge que se entenda o policial militar como um cidadão, titular de direitos e deveres, sujeito às fraquezas da condição humana.
Com frequência, ao sabê-lo fardado, o exige perfeito, como se fora um ser divino; ao sabê-lo falível, culpa toda uma instituição por eventual erro cometido, não se importando com as medidas punitivas impostas, após o tradicional e transparente processo de saneamento profissional.
Assim, na condição de presidente do Conselho Nacional de Comandantes Gerais das Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares, não poderia me calar diante da assertiva do deputado federal Hélio Bicudo, segundo a qual: "Se os efetivos da polícia forem aumentados, dada a sua vocação para a violência, correríamos o risco de, em vez de diminuirmos, aumentarmos os índices de violência" (Folha, 11/4/96, pág. 1-3).
Ora, no mínimo trata-se de um raciocínio simplista e preconceituoso, indigno de um político tão experiente e respeitado, pois busca punir, por meio do pecado da generalização, toda a polícia: aquela que serve o cidadão, protege a comunidade e que, muitas vezes, ajuda a nascer.
Reputo à obsessão aquela assertiva, lamento a sua eclosão intempestiva e veementemente a refuto. Afinal a segurança pública prescinde de discussões estéreis, além de não admitir receitas fantasiosas e nem permitir doces milagres.
Comporta o "tira", que se estira num pedaço pequeno da sua carência, porém abomina a tirania no espaço maior da sua essência.
Comporta, deseja e aplaude o trabalho legislativo sério, que busque editar leis que a favoreçam, protejam os policiais e amparem, dignamente, as suas viúvas e órfãos.

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