São Paulo, domingo, 21 de abril de 1996
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Para onde vai o nosso dinheiro

ALOYSIO BIONDI

Uma família é proprietária de uma casa, ou uma butique, ou uma fazenda que vale R$ 100 mil. Decide vendê-la. Surge um comprador, disposto a comprá-la pela metade do preço -R$ 50 mil-, e ainda por cima para pagá-la em 15 anos, com a primeira prestação somente daqui a três anos, e juros baixíssimos. Obviamente, a família vai defender o patrimônio que levou anos para acumular, e rejeitar a proposta.
No entanto, é o que milhões de famílias estão permitindo que o governo faça, com sua política de venda de empresas estatais a preço de banana, e até com empréstimos do próprio governo (por intermédio de um banco estatal, o BNDES).
A sociedade brasileira, as famílias brasileiras se esqueceram totalmente que as empresas "estatais" não são propriedade do governo, do Estado. São patrimônio, propriedade de toda a população, e por isso não deveriam estar sendo praticamente doadas a determinados grupos empresariais.
A sociedade pode ser favorável à privatização, à "venda" das empresas. Mas deveria opor-se à política de simplesmente torrá-las, com prejuízos ao seu patrimônio.
Qual a alternativa? Manter a política de privatização, mas com fornecimento, pelo governo, de amplas informações sobre motivos, preços, prazos, dando tempo à sociedade de debater prioridades e informar-se sobre a possibilidade de toda a população vir a ser acionista dessas empresas -e não entregá-las a grupos, com dinheiro do governo. Nosso.
Pode-se perguntar: e os investimentos que os setores em que essas empresas atuam estão exigindo com urgência? Ora, se o governo, por intermédio de seu banco, está entregando bilhões a grupos privados para "recuperarem" as estatais e até para "comprá-las", é evidente que o BNDES pode manter esses financiamentos, mesmo enquanto se prepara a privatização.
Aliás, o BNDES nasceu na época do "desenvolvimentismo" de JK exatamente com essa finalidade: financiar a instalação de uma infra-estrutura moderna, que permitisse a industrialização.
No momento, o BNDES tem estranhas prioridades, como financiar um dos setores mais lucrativos do país, e que não precisaria de apoio do governo nem juros baixíssimos: a construção de shopping centers. O setor que mais cresce no país.
Aberração
Depois do caso PC Farias, a Receita quis recadastrar os contribuintes para eliminar os CICs "frios". O recadastramento começou em 94, mas foi suspenso, para alegria dos sonegadores.
O recadastramento seria feito pelo Serpro, "empresa" que presta serviços de processamento de dados à Receita. O Serpro estava sucateado. Precisava de R$ 68 milhões para reequipar-se. O Ministério da Fazenda negou. "Economizou" R$ 68 milhões e deixou de arrecadar R$ 100 bilhões (com b) por ano. Por que o BNDES não pode emprestar em casos como o do Serpro?
Polianas
Deu no "Jornal Nacional" da Globo: "o bacalhau deixou de ser comida de rico. Com o barateamento das importações, ele está sendo consumido pelos pobres". E mais: "não apenas em ocasiões como a Semana Santa, mas em qualquer dia". Claro. Ganhando R$ 3,00 por dia, por que o trabalhador de salário mínimo iria deixar de comer bacalhau -a R$ 25,00 o quilo?
Dúvidas
Empresas podem parcelar débitos para com o INSS, em até 84 meses. Valor mínimo da prestação: 300 Ufir. Isto é: o micro ou pequeno empresário em débito tem que pagar tudo em uma ou duas vezes. Os grandes devedores levam vantagem?

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