São Paulo, domingo, 21 de abril de 1996
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Sem-governo

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - Espantosa a insistência com que FHC continua candidato. Foi candidato a vida inteira, a líder de esquerda, a ministro de Tancredo, Sarney e Collor, a prefeito de São Paulo e a presidente da República. Continua candidato à própria sucessão. E deixa o principal de seu cargo (que é a administração) para chacinadores de diversos feitios e tamanhos.
Desde os banqueiros que roubam o próprio banco -e que FHC só promete ameaçar com cadeia depois que a imprensa denuncia a tramóia- até a PM do Pará.
Não adianta invocar a autonomia dos Estados: o problema dos sem-terra não é municipal nem estadual, é federal.
Os paralelepípedos da rua Lins de Vasconcelos que o Nelson Rodrigues gostava de invocar estão indignados com a hipocrisia presidencial, sua falta de sensibilidade social. Prometeu reforma agrária durante a campanha, mas reformou a navegação de cabotagem e quer reformar toda a legislação social do país, quebrando a espinha do que ele insiste em chamar de Brasil arcaico.
Mais arcaico do que o Brasil é o presidente que envelhece em público. Para efeito externo, busca aparecer como papagaio de pirata em eventos que dão mídia e nos quais pode falar pelos cotovelos as obviedades de Acácio. Em particular, exerce a mais arcaica das políticas, que é a do exercício constante do próprio interesse.
Consequência desse sem-governo, desse arcaico presidente espalhafatoso, o país volta a espantar o mundo com os massacres que nem no tempo do regime militar chegaram a nível tão vergonhoso.
A tática de FHC será diluir responsabilidades: saber quem deu o primeiro tiro, quem liderou os sem-terra, punir o major e o sargento. A reforma agrária nem está aí. Mais importante para ele é ter os três quintos para obter a reeleição. O Brasil que se dane, desde que FHC satisfaça sua vulgaridade.

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