São Paulo, quinta-feira, 25 de abril de 1996
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A CIRANDA, DE NOVO

Pagar apenas R$ 4 a mais, sobre o preço à vista, para comprar a prazo um perfume importado parece um bom negócio. Mas esse custo adicional aparentemente pequeno pode embutir juros anuais superiores a 8.000%, cifra quase inacreditável.
Esse pequeno e singelo exemplo consta de pesquisa sobre os juros praticados no comércio paulista feita pela Anefac (Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade), resumida hoje por esta Folha.
Na média, mostra a pesquisa, o comércio cobra juros anuais estratosféricos, da ordem de 235,38%.
É uma evidência de que a queda nos juros no mercado financeiro não está sendo acompanhada pelo comércio.
Os abusos praticados por alguns comerciantes podem explicar parte do fenômeno. Mas há um aspecto perverso embutido no nível geral dos juros, ainda excessivamente elevado, apesar das quedas recentes.
Como está havendo um recorde de inadimplência (mais de 3 milhões de carnês estão com prestações em atraso em São Paulo, cinco vezes mais do que o registro histórico), o comerciante tende a cobrar mais de quem efetivamente paga, para compensar as perdas com os que não pagam ou atrasam os pagamentos.
Por isso mesmo, há uma lentidão maior do que seria normal para que se reflita, no comércio, a redução dos juros que está sendo verificada nos mercados financeiros.
Mas o relatório da Anefac chama a atenção para outro aspecto inquietante. Em muitos casos, os comerciantes "estão tendo ganhos financeiros superiores aos ganhos com sua atividade própria (o comércio)", diz o relatório.
É a maneira técnica de se chamar a velha ciranda financeira, em que o empresário se vê compelido a apostar mais em ganhos com a aplicação do dinheiro do que com a produção.
Era a situação predominante antes da estabilização da moeda, decorrente do Plano Real. Se se está, de fato, voltando a essa distorção, fica evidente que há um grave erro de dosagem na política monetária.

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