São Paulo, quinta-feira, 2 de maio de 1996
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O mínimo e Brecht

CLÓVIS ROSSI

São Paulo - Um pequeno quadrinho nesta Folha (página 2-4 de ontem) informa que "o mínimo deveria ser de R$ 764,19 para manter as necessidades de uma família de quatro pessoas, conforme a Constituição".
Como o mínimo subiu para R$ 112, tem-se que a Constituição está sendo violada impunemente (faz tempo, aliás). E ninguém parece se importar com isso.
Os liberais de plantão fazem carga cerrada contra o governo porque emite MPs (Medidas Provisórias) em quantidades industriais. Por que não se incomodam um pouquinho que seja com essa aberta, flagrante e permanente violação de um dispositivo constitucional?
Um ministro do STF dá liminar que breca a tramitação da emenda da Previdência, entendendo que o jogo, como está sendo feito, viola o regimento da Câmara.
Violar a Constituição não é infinitamente mais grave?
O governo reelaborou a teoria de "primeiro o bolo cresce, depois a gente redistribui". Agora, não é mais o bolo que precisa crescer. É o déficit público que precisa encolher, para que se possa dar aumentos mais significativos para o mínimo.
Supõe-se que o governo esteja trabalhando duro para combater o déficit público, de forma que, quanto antes, possa melhorar o mínimo, não é?
Nada. Ao contrário, está piorando as coisas. É raro passar um dia sem que os jornais anunciem verbas públicas para algum setor. Dinheiro para os bancos em dificuldades? Tem. Dinheiro para os ruralistas endividados? Tem. Dinheiro para os Estados falidos? Tem.
Só não tem para cumprir a Constituição. E ninguém mais se escandaliza. Bertolt Brecht tem um belíssimo texto sobre esse tema. Mas também ninguém se interessa.

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