São Paulo, domingo, 5 de maio de 1996
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Cubatão quer ocupar viveiro de aves com porto e indústrias

MARCUS FERNANDES
DA AGÊNCIA FOLHA, EM SANTOS

A Prefeitura de Cubatão quer ocupar com indústrias e terminais portuários a área de um dos maiores viveiros naturais de aves aquáticas em toda a América do Sul.
Um estudo recém-concluído pelos biólogos Fábio Olmos e Róbson Silva e Silva mostrou que, desde os anos 60, os manguezais da cidade transformaram-se em local de pouso e habitat dos animais (leia texto à página 5-16).
Pesquisadores e autoridades ouvidos pela Agência Folha têm restrições a esse tipo de projeto, que faz parte do novo Plano Diretor do município e deve ser votado nos próximos dias pelos vereadores.
Para o gerente regional da Cetesb de Cubatão, Elio Lopes dos Santos, o novo Plano "é um desastre". Segundo ele, "por mais equipamentos de combate à poluição que se instalem, haverá risco à segurança de toda a região".
A prefeitura nega. "Cubatão nunca foi o 'Vale da Morte'. Nossos problemas ambientais estão parcialmente sanados", afirmou o prefeito Oswaldo Passarelli (PFL).
Ele confirmou que o Plano Diretor coloca os manguezais estudados pelos biólogos como área passível de ser utilizada como retroporto (pátios para contêineres, máquinas e cargas).
"Entretanto, isso só será permitido caso os projetos sejam aprovados por relatórios de impacto ambiental", afirmou a gerente de planejamento urbano da prefeitura, Lígia Maria Martins do Monte.
A bióloga Izabel Fonseca discorda. Entre 90 e 95, ela pesquisou dezenas de relatórios de impacto ambiental em áreas de mangue. A maioria não exigia a instalação de audiências públicas para a sua análise e aprovação.
"O relatório não é um favor, e sim uma exigência legal. Porém, ele deve especificar a necessidade de consulta à comunidade. Só assim é possível avaliar por completo os possíveis danos ambientais", afirmou Fonseca.
Impacto no porto
Segundo o pesquisador do Instituto de Pesca de Santos, Acácio Ribeiro, a destruição dos manguezais de Cubatão poderá comprometer a navegabilidade dos navios no canal de acesso ao porto.
O canal, usado pelos navios para atingir o cais santista, também dá acesso às áreas de mangues de Cubatão, onde já estão instalados os portos da Cosipa (siderúrgica) e Ultrafértil (fertilizantes).
Ribeiro afirmou que o mangue funciona como uma "área de retenção" para os sedimentos da mata, impedindo que eles se acumulem nos rios que cortam os manguezais e no canal do porto.
O diretor da área de engenharia da Codesp, estatal que administra o porto, Luiz Alberto Costa Franco, observa que há uma condição para que a ocupação dos manguezais não prejudique o porto.
"Essa ocupação não pode provocar aumento na vazão da água que corta os mangues em direção ao canal do porto. Do contrário, isso poderá provocar erosão e comprometimento do canal", afirmou Franco.
Em janeiro, a Codesp arrecadou R$ 12,4 milhões em taxas para o trabalho de dragagem do canal de acesso dos navios ao cais. Nesse mesmo mês, a arrecadação total da estatal foi de R$ 33 milhões.
Poluição
Segundo a professora Yara Novelli, do Instituto Oceanográfico da USP, o material dragado, rico em substâncias contaminadoras, é despejado pela estatal próximo à Ilha da Moela, localizada em frente às praias de Guarujá.
A Codesp confirmou a informação de Novelli. De acordo com a estatal, são despejados anualmente, a cerca de quatro quilômetros da costa de Guarujá, seis bilhões de litros de sedimentos dragados do canal do porto.
O local escolhido para deposição "final" desse material é utilizado desde a década de 70 pela Codesp. Segundo a estatal, as correntes marinhas da região dispersam os poluentes no alto-mar.
No início do século, a região de mangues de Cubatão se estendia por mais de 130 quilômetros quadrados. Hoje, restariam em bom estado de conservação menos de 60 quilômetros quadrados de mangues, segundo estudo feito pela Cetesb em 94.
A lei federal 4.771, de 1965, define os manguezais como área de preservação permanente. A Agência Folha apurou que empresas da região e a prefeitura foram multadas em 95 por aterrar os mangues.
Desde 1948, o Brasil é signatário de um acordo internacional que obriga a conservação dos locais utilizados pelas aves em suas rotas migratórias.

LEIA MAIS sobre Cubatão na pág. 5-16

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