São Paulo, domingo, 12 de maio de 1996
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só comparáveis a nós mesmos

BENTO PRADO JÚNIOR

Nada mais justo do que o empate, no último domingo, entre Palmeiras e Corinthians. Um homem apenas, desde que genial, desequilibra, como se diz, uma partida -ou, como diria Heidegger, a partida, a linha que separa a Terra do Céu, os mortais dos imortais, que dá consistência ao mundo em que vivemos.
Confessemos que Marcelinho Carioca é um desses privilegiados, que brincam com o destino. Ouvindo o jogo, no domingo, cercado de adversários, quando todos concordavam que, no início do segundo tempo, dois a zero era um resultado definitivo, eu, na minha angústia, dizia: "Mas há o Marcelinho, e qualquer falta na boca da área é mortal". Não deu outra, o Marcelinho não derrotou o Palmeiras, que, por essência, e por causa do Luxemburgo e de seus jogadores, é invencível. Mas estabeleceu, com justiça, algo como um limite externo: o Palmeiras só brilha em sua própria essência no combate contra o seu Outro.
Concessão necessária feita ao adversário (sem cuja contraposição jamais poderíamos aspirar à condição de melhor time do mundo), é preciso referendar que não somos comparáveis (a não ser ao Santos de Pelé, que foi circunstancialmente melhor, apenas por uma década efêmera), senão com nós mesmos, isto é, com a Academia. O que era a Academia? Sócrates, Platão, Aristóteles? Shakespeare, Montaigne e Pascal? Não, caro leitor, a Academia era aquela de Don Ademir da Guia.
Éramos então melhores (como sugeriu, na televisão, o excelente César, que era nosso atacante) ou somos melhores agora? Ou terão nossos adversários perdido categoria? Uma coisa é certa: assistindo, hoje, aos jogos do Palmeiras, lembro-me de décadas atrás, quando éramos todos felizes no Brasil. O Rivaldo não joga igualzinho ao Ademir da Guia (como sempre sonhei jogar, e tento fazer Filosofia)? O próprio Kléber não está virando uma espécie de Luís Pereira? Comemoremos, paulistas e brasileiros, ludopedium habemus. (Tradução do latim: "temos futebol").

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