São Paulo, segunda-feira, 13 de maio de 1996
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Curso ensina a executivos como enfrentar entrevista

FERNANDO PAULINO NETO
DA SUCURSAL DO RIO

Executivos consideram jornalistas, de maneira geral, uma das formas de encarnação do capeta.
Com o objetivo de mudar esta visão, empresas passaram a contratar especialistas para ensinar seus diretores a enfrentar os repórteres.
"Procuramos mostrar que o repórter não é demônio, mas também não é anjo", diz o jornalista Nelson Lemos, 59, com 39 anos de profissão.
"O ponto central é fazer o executivo entender que a pessoa a sua frente com um bloquinho ou um microfone é um ser humano", diz Nei Loja, psicólogo que trabalha nesse treinamento desde 1986.
Para humanizar o repórter na visão do executivo, os cursos mostram como é o dia-a-dia do jornalista. Loja traça o perfil de uma pessoa estressada e sempre com pressa.
"O repórter tem sempre mais de uma pauta (previsão de reportagem) para cumprir por dia e não pode perder tempo", diz.
Uma das queixas dos executivos é que o encontro dos dois é "uma relação desigual, onde o jornalista é mais poderoso", diz Lemos.
O "poder" do jornalista, no modo de ver dos executivos, é caracterizado por ele poder fazer o que quiser com a informação que lhe é prestada. Além disso, considera-o impreciso ao escrever e acha que "há jornalistas que distorcem o que se fala", diz Lemos.
Um dos mitos que o curso procura derrubar é o de que o repórter pode tudo. "O repórter não é onipotente", diz Loja. Há na redação outros jornalistas que influenciam no trabalho que realizou durante a entrevista, justifica.
Loja diz que o objetivo do curso é "a convergência de interesses". O jornalista está em busca de notícia. A empresa tem algo para divulgar.
No entender de Loja, é normal o executivo ter prevenção contra o repórter. Ele cita pesquisa inglesa na qual 47% das pessoas dizem ter medo de falar em público, enquanto só 18% têm medo de morrer. Falar com a imprensa é considerado falar em público.
Entre as atividades do curso de Loja, que custa entre R$ 3.500 e R$ 16 mil, há uma entrevista-surpresa para televisão. No meio de uma palestra entra uma equipe com repórter e câmera, que faz perguntas embaraçosas para o executivo.
Outro exercício é o executivo estruturar e dar um título a um texto (com informações previamente dadas) em 15 minutos. Isto tudo simulando o ambiente de redação com televisões e rádios ligados em volume alto.
Este exercício é "para o executivo perceber como é uma redação". O resultado é que todos fazem textos errados. A conclusão: "se você fez errado, o jornalista também pode errar".
Lemos, que cobra entre R$ 5 mil e R$ 8 mil, contrata repórteres para fazer entrevistas com os participantes do curso alguns dias antes.
Ele instrui os jornalistas a jogar "cascas de banana" (perguntas feitas para conseguir dos entrevistados declarações que eles não querem dar) na entrevista". Depois, o texto é discutido no curso.

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