São Paulo, segunda-feira, 13 de maio de 1996
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Ator índio defende sua cultura nativa em filme de Jarmusch

ADRIANE GRAU
FREE-LANCE PARA A FOLHA,

em San Francisco
Para compor o índio Nobody em "Dead Man", de Jim Jarmusch, o ator norte-americano Gary Farmer se baseou na sua própria experiência.
Assim como o personagem, ele foi afastado de sua cultura nativa muito cedo. Mas continuou morando em Ontário (Canadá), próximo à Reserva das Seis Nações, onde fica o clã Wolf, do povo Cayuga, ao qual pertence sua família.
Depois de se formar em comunicação e estudar fotografia, ele decidiu iniciar uma publicação para seu povo.
Nasceu então, Aboriginal Voices, uma revista trimestral distribuída em toda a América do Norte. Cinema não é sua prioridade, mas o jeito bonachão já lhe valeu participações em "Miami Vice" e "Academia de Polícia" e nos filmes "Dark Wind" (1992, direção de Errol Morris) e "Powwow Highway" (1988, direção de Jonathan Wack).
*
Folha - Ajudar um homem a morrer, como acontece em Dead Man, é parte de sua cultura?
Gary Farmer - Sim, e é uma honra. A morte é um momento de choro e lamentação para os outros, mas não para os nativos norte-americanos.
Folha - A cultura indígena aparece em vários traços da vida cotidiana no Brasil. Chás, comidas, objetos. Você poderia apontar o mesmo fenômeno nos Estados Unidos?
Farmer - Aqui acontece de forma muito distorcida.
Folha - Como Aboriginal Voices começou?
Farmer - Queríamos ter controle sobre o que nos afetava. Apresentamos uma perspectiva mais realista de quem somos, quais nossas nações e o que fazemos.
Folha - A rádio foi uma consequência?
Farmer - Acabamos de começar. A idéia é criar uma rede e desenvolver uma criação coletiva. Entramos com a programação e as aldeias têm que criar as estações.
Folha - Você já pensou em escrever um roteiro?
Farmer - Sim. Podia fazer isso facilmente. Só que não gosto de entrar no jogo para conseguir a realização que pode vir daí.
Folha - Mas para formar a revista você não teve que entrar nesse sistema?
Farmer - Sim, mas aí fiz por uma causa própria.
Folha - Dizem que tocar gaita é sua grande paixão. Verdade?
Farmer - Eu tenho a gaita comigo todo o tempo, inclusive durante as filmagens de "Dead Man", mas eu e Jarmusch não achamos nenhuma cena em que ela pudesse ser usada.
Folha - Como você encara a febre de tambores que tomou conta dos Estados Unidos há alguns anos? Parece que todos querem tocar como os nativos.
Farmer - Eu deveria prestar mais atenção nisso. Lidamos com fenômenos como esse na revista. O renascimento de culturas indígenas ao redor do mundo é um fenômeno. Precisamos orar para que as coisas melhorem.
Folha - Você ora?
Farmer - Não tanto quando eu deveria.

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