São Paulo, segunda-feira, 13 de maio de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Porções parisienses cabem num dedal

Freguesa tradicional cheira a roquefort! Rarará.

JOSÉ SIMÃO
DO ENVIADO ESPECIAL

Como se come em Paris, mon Dieu. Já voltei pra casa avisando a minha empregada: "Agora, menos de cinco pratos é ofensa." Se tiver grana. Sem grana é só pegar uma baguete na rua e um copo de vinho que é charmosíssimo. Aí vão os restaurantes que visitei:
La Coupole. Nada demais. Folclore puro.
Guy Savoy. Um dos papas da nouvelle cuisine française. Dos deuses! O tamanho do nome dos pratos é inversamente proporcional ao dos pratos. Sopa de salsão com trufas brancas na manteiga de trufas selvagens e diabólicas salsinhas. Aí, vem um dedal.
E a degustação prossegue: patê de fígado de ganso au petit gelée fumée, sopa de alcachofra com lâminas de parmesão com trufas negras e torradas com manteiga de trufas negras e vitela com purê de batatas com trufas. Brancas!
Musse de grapefruit com molho aromatizado de mexerica e sorbet de chá com calda de baunilha com pimenta. E aí cheguei ao hotel e tomei uma Coca-Cola. Uma outra, um sal de frutas. E um terceiro vomitou. Isso é um crime! Vomitar a comida do Guy Savoy. Então vomita no tupperware! Rarará. Foi verdade!
Sujos de sangue
Au Pied de Cochon. Um clássico dos clássicos. Em frente ao ex-mercado Forum des Halles. Diz que os açougueiros costumavam entrar no restaurante com os aventais ainda sujos de sangue.
Tudo muito tradicional, tanto a comida quanto o público. Entra um casal finésimo com um cachorro, que comeu na mesma louça fina dos donos.
Enquanto o casal traçava um pé de porco com champanhe, o garçom se ajoelhava embaixo da mesa só para servir o inocente, que, no mínimo, devia estar comendo uma coisa mais light: vianda ao leite, por exemplo.
Após o jantar, o casal contou que é o cachorro que escolhe o restaurante: "Au-au, Guy Savoy não, hoje Au Pied de Cochon".
Ao nosso lado, uma senhora de 85 anos traçava um pé de porco. E ela cheirava a roquefort. Francesa típica: a vovó não viu a água. Eu acho que quando ela morrer vão servir o pé dela. Rarará! Eu não disse que o público era tradicional?
Só que não precisa encarar o pé de porco. Que tal uma sopa de cebola, ostras ou trutas com amêndoas? Com um bom vinho ou cerveja, estourando de gelada!
Restaurante da Galeries Lafayette. Simpático para um almoço light. Pedi saumon au sauce de loseille avec du Cocá. Com Coca-Cola. Ofensa das mais graves! "Mas isso é um pecado mortal, monsieur". Mas eu gosto de pecados. Pior é que as garçonetes não trazem a Coca. Não é que elas esquecem, nem registram.
Moral da culinária francesa: a comida é sofisticada, mas a gente gosta mesmo é de baguete de rua. E uma noite, quando reclamei que estava um pouco enjoado, um taxista parisiense disse: "Muita manteiga, monsieur, muito creme". Rarará!

Texto Anterior: É bom suar em Paris até sem banho
Próximo Texto: Instituto do Mundo Árabe tem cara de roupa do Paco Rabanne
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.