São Paulo, domingo, 26 de maio de 1996
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O perigo das generalizações

JOSÉ ROBERTO GRAICHE

Mais uma vez, os homens públicos precisam estar atentos em relação aos seus compromissos com o país e com a população, sob pena de serem julgados nas urnas.
Duas situações são particularmente críticas no Brasil: a falta de defesa das causas populares e a generalização dos fatos.
É nesse momento que o parlamentar corre o risco de acolher causas aparentemente populares e que na verdade não o são.
Cito, como exemplo, os vários projetos de lei que tramitam há algum tempo pelo Congresso Nacional e reduzem de 20% para 2% a multa por atraso no pagamento de quaisquer tipos de contas e prestações vencidas.
Explico: muitas vezes, os parlamentares, afoitos pelo voto e na procura do que consideram causas populares, propõem leis sem atentarem para o formalismo da estrutura legal de suas sugestões.
Colocam na vala comum os maus pagadores de contas e prestações vencidas com os que não pagam dívidas essenciais à subsistência de terceiros, como aluguéis (locatários que não pagam locadores) ou condomínios (condôminos residentes em apartamentos).
A redução nas multas por atraso do pagamento de aluguel e condomínio, ao contrário das dívidas comuns, representa um perigoso estímulo à inadimplência.
A multa, nessas circunstâncias, é regida pela lei nº 4.591/64, que prevê taxas de 0% a 20%. Nesses casos, não se pode confundir multa por falta de pagamento com a correção monetária de contas e de prestações vencidas.
Ao proporem a redução da multa para 2% -praticamente o mesmo rendimento das cadernetas de poupança e de outras remunerações-, não levam em conta que seu objetivo, no segmento imobiliário, é punir o mau pagador e penalizar a falta de pagamento.
Essa quebra de compromisso, além de inadmissível, acarreta prejuízos para todos os condôminos e proprietários de residências de aluguel, não tendo nada a ver com juros e correção monetária.
Gostaria de observar que, no caso dos aluguéis e gastos condominiais, a multa é resultante de um acordo entre as partes: proprietário e inquilino combinam data de pagamento e multa por atraso.
No caso dos apartamentos, o rigor precisa ser ainda maior, pois discute-se o interesse de uma comunidade. E é ela que, em assembléia geral, com a presença dos interessados, fixa os valores convenientes, até o limite de 20%.
Se as decisões dessa convenção não forem observadas, os bons pagadores precisarão se responsabilizar pelos maus pagadores.
Caso houvesse, efetivamente, a pretendida redução para os sugeridos 2% para aluguéis e condomínios, a multa perderia seu efeito coercitivo e deixaria de desestimular a inadimplência.
Dessa forma, espera-se que, ao lidar com leis tão abrangentes, o Congresso diferencie a falta de pagamento de bens ou empréstimos adquiridos de compromissos como aluguéis e condomínios.
O perigo da generalização pode conflitar com os interesses de boa parte da população e prejudicar verdadeiras causas populares.

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