São Paulo, domingo, 9 de junho de 1996
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o que elas querem é raro

JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO

Em busca do homem culto e bem de vida
O ideal nunca esteve tão distante da realidade. O perfil masculino idealizado pelas mulheres e traçado por uma pesquisa do Datafolha junto a 401 paulistanas é uma raridade entre os homens brasileiros, como mostram os dados do IBGE.
A sondagem do imaginário feminino revela, em síntese, a preferência por um homem de 20 a 40 anos, culto, bem sucedido na profissão, solteiro e branco. Vã ilusão. Mais de 99% dos exemplares nacionais do gênero tropeçam em ao menos uma dessas exigências.
Segundo a última Pesquisa Nacional por Amostra Domiciliar (Pnad 93), há cerca de 47,5 milhões de homens com mais de 15 anos no Brasil. Na faixa etária predileta das mulheres, esse número já cai para menos da metade: 22,5 milhões.
O brasileiro médio é mais jovem do que gostariam as solteiras e separadas entrevistadas pelo Datafolha: a faixa etária masculina mais numerosa é a de 15 a 19 anos -sem contar, é claro, os impúberes.
Diplomados
O perfil ideal exige que o homem seja também solteiro. Sobram apenas cerca de 8 milhões. O universo masculino de onde sairá o parceiro ideal já está reduzido a 17% do grupo inicial e os principais fatores de eliminação nem foram computados.
Diploma não é garantia de cultura, mas o dado estatístico que mais se aproxima do adjetivo "culto", exigido pelas mulheres, é o que mede a escolaridade do brasileiro. E essa não chega a ser um orgulho nacional.
A maioria dos candidatos a marido ou namorado tem, no máximo, sete anos de estudo. Ou seja, não concluiu o 1º grau.
O item "sucesso profissional" também não consta dos questionários de pesquisa do IBGE, mas pode-se ter uma idéia do desempenho masculino nesse campo através dos seus rendimentos mensais.
Sempre se soube que o brasileiro ganha pouco, mas os números da última Pnad são de assustar: a maioria dos homens ocupados recebe até R$ 224/mês. Não é exatamente o que se poderia chamar de sucesso.
Traduzindo "culto e bem-sucedido" em 2º grau completo e renda mensal igual ou superior a 20 salários mínimos (R$ 2.240,00), o resultado das exigências femininas é dramático: sobram só 703.768 homens. Em outras palavras, apenas 15 a cada 1.000 dos que entraram nessa corrida ainda estariam no páreo. Projetando-se a proporção de brancos na população masculina (60%), só nove chegam à reta final.
Realismo
Para concluir a prova de obstáculos, esses parcos sobreviventes precisariam ainda ser altos, magros, ter olhos castanhos e cabelos curtos, não usar barba, ser morenos, não-musculosos, honestos, companheiros, inteligentes...
Em resumo: se o ideal feminino de homem fosse aplicado na realidade, as mulheres estariam condenadas ao celibato e a população brasileira entraria num processo de diminuição inédito até em tempos de guerra.
Na prática, a teoria é outra. Das 51 milhões de brasileiras maiores de 15 anos, mais da metade está casada: 28,6 milhões. E com homens mais velhos, menos cultos e sem tanto sucesso profissional quanto o ideal.
A explicação para esse "realismo" da mulher brasileira talvez esteja no fato de que o mercado matrimonial lhe é francamente desfavorável.
Para começar, ela já enfrenta a falta de homens. Há um déficit de quase 2 milhões em relação ao contingente feminino em idade fértil. Com o passar dos anos, suas chances de encontrar um parceiro parecem enunciado da Lei de Murphy: tudo vai piorar, é só questão de tempo.
Como ensina a demógrafa Elza Berquó em sua teoria conhecida como "pirâmide da solidão", o universo de parceiros potenciais da mulher é formado pelos homens da mesma idade ou mais velhos. Para os homens, é o oposto.
Dessa forma, quanto mais velha a mulher, mais perto do topo da pirâmide ela fica e, por consequência, menos parceiros potenciais ela tem.

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