São Paulo, domingo, 16 de junho de 1996
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Vítimas levavam contas e frases de amor

LÚCIA MARTINS; SUZANA SINGER
DA REPORTAGEM LOCAL

Amontoados em uma sala do 5º Distrito Policial, os objetos pessoais recolhidos nos escombros do shopping servem de indícios sobre quem são (ou eram) as vítimas da tragédia de Osasco.
Foram encontradas poucas coisas de valor: apenas dois celulares (um ainda funcionando) e alguns cheques. Em dinheiro, no total, havia R$ 2.560,00.
Mensagens românticas, decalques, figuras da Minnie e escovas de cabelo mostram que a maioria das vítimas é mulher.
Cheia de pó e um pouco rasgada, a pasta de Fátima Inês Cecílio Diegues resistiu praticamente intacta. Na capa, um decalque dourado diz "lembrei-me de você". As matérias -pedagogia, matemática, literatura infantil, sociologia- são separadas em partes coloridas.
Apesar da letra infantil, Fátima tinha 36 anos -faria 37 na próxima sexta-feira.
Cabeleireira, ela tinha voltado a estudar com a filha, Vanessa, de 16 anos. A mãe estava no 4º ano do magistério, classe C. A filha, apelidada de Xuxa, estava no 2º ano D.
As duas saíram mais cedo da Escola Estadual Raposo Tavares na terça-feira, passaram no shopping e morreram na explosão.
Na bolsa, Fátima ainda levava, provavelmente de lembrança, o bilhete de uma excursão de ônibus feita em maio.
Outra vítima fatal, o comerciante João Gilberto Berklian, 29, tinha pago várias contas no dia da explosão. Carregava na carteira ainda o RG, título de eleitor, cartão do banco -e uma nota de U$ 1.
Às vésperas do Dia dos Namorados, frases românticas apareciam em cadernos, agendas, em recados guardados dentro de carteiras.
Jane Duarte da Cruz Soares, 17, que pode ter se ferido no shopping, levava um cartão com um poema: "amor é sentimento que não se impõe/ é dádiva que nasce do coração/ e todos que se amam têm/ pensamentos voltados para o céu/ onde seu amor teve início".
Na agenda de uma estudante chamada Rosângela, um recado: "muito da beleza da vida está nas pessoas que se importam".
E, no caderno de uma menina não-identificada, lia-se: "se amar é frescura, eu sou a maior fresca".
(Lúcia Martins e Suzana Singer)

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