São Paulo, domingo, 16 de junho de 1996
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Infra-estrutura do Chile não satisfaz

GILSON SCHWARTZ
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Vedete dos mercados latino-americanos, citada como modelo de reforma com privatização do sistema previdenciário, exportadora de capital, a economia do Chile é frequentemente comparada aos tigres asiáticos.
Entretanto, encontrar análises objetivas sobre o Chile na mídia globalizada é hoje quase tão difícil quanto pinçar reservas críticas ao México antes da crise de 1994.
A economia chilena tem sido palco de um dos mais amplos e profundos processos de internacionalização. Há poucos dias o Banco Osorno e o La Union foram comprados pelo Banco Santander. A instituição espanhola passa a controlar o maior banco do Chile.
A italiana Parmalat, no Chile desde 1994, anunciou na semana passada planos de, até o ano 2000, dominar 25% do mercado de lácteos e 20% do mercado de sucos. Nos últimos dias a "holding" de telecomunicações italiana Stet entrou no capital da Empresa Nacional de Telecomunicaciones (Entel, com 40% do mercado de longa distância e internacional).
Falta investimento
Há outros exemplos. O processo é basicamente de mudança na composição dos maiores grupos empresariais. Espera-se algum investimento por conta dessa entrada de capital estrangeiro, mas parece óbvio que a característica mais importante é a mudança de proprietários, não o aumento de capacidade produtiva.
O dilema macroeconômico implícito, potencial, é simples. O capital de fora ocupa o lugar de capitais locais, sem necessariamente ampliar a capacidade produtiva.
Mas a entrada de capitais pode financiar o consumo. O país muda de cara, mas não dá um salto de desenvolvimento. Mudam os donos do capital e os consumidores, endividando-se, compram mais.
O alarme já está soando frente ao aumento espetacular do endividamento consumista. Chega a 1,7 milhão o número de consumidores endividados, 80% com bancos e o resto junto à rede varejista. O crédito ao consumo cresceu 29% em 95 frente a 96. O valor médio das dívidas subiu 75%.
Os dados vieram a público na semana passada porque é grande a polêmica em torno de um projeto de lei para dar maior transparência às informações sobre crédito ao consumo, hoje acessíveis só aos bancos. Há quem tema pela "sustentabilidade" do consumismo ou do "sobreendividamento".
O problema que fica é a dificuldade, mesmo no Chile, de deslocar um modelo intensivo em consumo para um apoiado em investimentos. Os fundos de pensão chilenos, com recursos de US$ 26 bilhões (40% do PIB), têm investido muito no exterior.
Segundo a Câmara Chilena de Construção, naturalmente interessada no assunto, o país perde US$ 1,5 bilhão/ano por infra-estrutura ruim. Seriam necessários US$ 11 bilhões nos próximos cinco anos para reduzir a perda.
Os auges cíclicos de endividamento consumista na América Latina enfrentam um problema clássico: os choques externos. Na sexta-feira o mercado mundial de cobre naufragou com a fraude bilionária da Sumitomo. As autoridades chilenas afirmam que o colapso do mercado de cobre é apenas temporário. Oxalá o seja.

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