São Paulo, sexta-feira, 21 de junho de 1996
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Teorias conspiratórias são parte da política russa

OLEG SCHEDROV
DA "REUTER", EM MOSCOU

Nenhum drama político pode ser considerado completo na Rússia se não for acompanhado de pelo menos uma teoria conspiratória.
A demissão repentina de três membros da administração Ieltsin após a destituição de Pavel Gratchev do Ministério da Defesa não foi exceção a essa regra.
À primeira vista, o presidente agiu com um objetivo claro com as demissões de ontem: conquistar o voto dos liberais para assegurar a vitória no segundo turno.
Ieltsin declarou que os três foram demitidos "por tirar muito e somar pouco" e que a demissão não tinha ligação com um incidente bizarro ocorrido durante a noite, no qual agentes de segurança leais a dois deles detiveram integrantes da campanha de Ieltsin.
Mas isso tudo soa simples demais para uma platéia russa criada à base de uma dieta constante de conspirações e lutas pelo poder.
Foi o ex-chefe das reformas econômicas Anatoli Tchubais quem serviu o ingrediente que faltava e evocou a teoria da conspiração.
A mesma teoria já havia sido levantada pelo novo secretário do Conselho de Segurança russo, Alexander Lebed, sobre a reação de oficiais à demissão de Gratchev.
A eleição presidencial inteira tem sido marcada por acusações de levantes tanto no campo de Ieltsin quanto no dos neocomunistas.
As teorias golpistas não constituem novidade. Desde a Revolução Russa (1917), o país tem vivido à sombra da expectativa de golpes e conspirações.
Na década de 30, o ditador Josef Stálin sentenciou à morte dezenas de milhares de funcionários do governo e chefes militares acusados de fomentar golpes contra ele.
Milhões de pessoas inocentes, acusadas de ligação com as conspirações, morreram em celas e campos de trabalhos forçados.
Khruschov
Após a morte de Stálin, em 1953, Nikita Khruschov deu um golpe para expulsar os adversários. Lavrenti Beria, assessor de Stálin, foi acusado de espionar e executado.
Em 1957, Khruschov trouxe tropas fiéis para mais perto de Moscou para esvaziar uma conspiração de altos funcionários do governo, que planejavam derrubá-lo. O próprio Khruschov foi derrubado numa conspiração do Partido Comunista em 1964.
Os acontecimentos de 1991, que marcaram o fim da superpotência comunista, infundiram novo ânimo nas teorias conspiratórias.
Em agosto daquele ano, altos funcionários do Kremlin prenderam Mikhail Gorbatchov e colocaram tanques nas ruas de Moscou.
Mas a tentativa de acabar com as frágeis reformas da perestroika terminou três dias mais tarde.
Em outubro de 1993, Ieltsin esmagou com violência a resistência dos defensores do dissolvido Parlamento linha-dura da era soviética. O presidente os acusou de conspirar para reverter suas reformas. Mais de cem pessoas morreram em vários dias de conflitos.

Tradução de Clara Allain

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