São Paulo, quarta-feira, 26 de junho de 1996
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Legista contesta a versão oficial para a morte de PC

ARI CIPOLA
DA AGÊNCIA FOLHA, EM MACEIÓ

O chefe do Departamento de Medicina Legal da UFAL (Universidade Federal de Alagoas), George Sanguinetti, contestou ontem a versão da polícia alagoana de que o assassinato de Paulo César Farias foi crime passional.
Na versão de Sanguinetti, Suzana Marcolino não se suicidou, e há 90% de chance de PC não ter morrido deitado. Para complicar ainda mais a versão da polícia, ele afirma que a Secretaria de Segurança está pressionando o legista responsável pela autópsia -Gerson Odilon- para que faça um laudo inconclusivo, que favoreça a tese do assassinato por motivos passionais.
"O professor Gerson Odilon me disse que está sofrendo pressões para adaptar o laudo à versão da polícia. Ele está sendo pressionado por Eduardo Amaral (procurador da Secretaria de Segurança)."
A versão de Sanguinetti, que além de professor da UFAL há 20 anos é coronel da PM e diretor do Hospital da Polícia Militar de Alagoas, causa reviravolta no caso.
O governador Divaldo Suruagy (PMDB) convocou o secretário de Segurança, José Amaral, e os responsáveis pelo inquérito para uma reunião no início da noite.
Os três legistas que fizeram a autópsia em PC e na namorada são ex-alunos de Sanguinetti vinham fazendo consultas informais a ele.
O legista Gerson Odilon, responsável pela redação do laudo das mortes, é assistente de Sanguinetti na UFAL. Segundo Sanguinetti, Odilon lhe deu as fotos de PC e de Suzana feitas na autópsia e, após analisarem o caso, teve autorização do legista para divulgar o laudo e a pressão que vem sofrendo.
Essa pressão, segundo Sanguinetti, é a responsável pelo fato de o laudo da autópsia não ter sido concluído até ontem.
"A polícia de Alagoas está querendo adaptar o laudo à sua versão de homicídio seguido de suicídio, que não poderia ser divulgada antes de eles terem os resultados da autópsia em mãos", afirmou.
Após a reunião com o governador, Odilon, ao lado do secretário de Segurança, negou estar sofrendo pressões.
Em pé
Sanguinetti disse que a medicina legal mostra que PC não poderia ter morrido deitado, já que a bala faz dentro de seu tórax uma trajetória circular. A bala entrou pela região da axila esquerda de PC, atravessou os pulmões para se alojar nas costas, já perto da pele da omoplata direita do empresário.
"Qualquer autor descreve essa trajetória circular da bala sendo possível apenas em casos em que as vítimas estejam em pé. Há 90% de chance de PC ter sido morto em pé", afirmou.
O tiro dado em PC foi disparado a 1m20 de distância e não à queima-roupa, como sustentou a polícia alagoana. Sanguinetti disse ter chegado a essa conclusão porque não encontrou sinais de pólvora no início do orifício.
Para ele, uma pessoa inexperiente no manuseio de armas "jamais mataria alguém disparando a essa distância e muito menos daria um tiro tão preciso".
Ajoelhada
Para derrubar a tese de suicídio de Suzana, Sanguinetti afirma que o percurso da bala em seu corpo foi de cima para baixo.
"É o primeiro caso de suicídio em que a bala desenvolve uma trajetória descendente", afirmou.
Para dar o tiro no peito, e a bala fazer a trajetória percorrida, Suzana teria de ter usado a mão esquerda para apoiar a direita, que estava com a arma, disse Sanguinetti. Mas havia sinal de pólvora só em sua mão direita, o que elimina a possibilidade de suicídio, para ele.
Outro ponto divergente é a posição do corpo. Segundo Sanguinetti, para estar deitada com parte do corpo encostado na parede e a com a arma entre as pernas, Suzana só poderia ter se matado ajoelhada. Mesmo assim, para ele, a arma teria de estar entre as mãos de Suzana e não entre as pernas.

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