São Paulo, quarta-feira, 26 de junho de 1996
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Educação: o fim das licenciaturas

DILVO I. RISTOFF

O ministro Paulo Renato Souza mostrou-se indignado com o fato de que a aluna Luciana Soares da Silva, a oito meses do vestibular, não tem aulas de várias disciplinas, por falta de professor. O ministro classificou o fato de "revoltante" e, ao mesmo tempo que jogava a peteca da responsabilidade sobre prefeitos e governadores, aparecia com mais um paliativo para "resolver" o problema.
A sua proposta ameaça transformar o artigo 62, item II, da LDB de Darcy Ribeiro em ato administrativo, mesmo antes de o texto virar lei. Paulo Renato pretende colocar em prática desde já os tais "programas de formação pedagógica para portadores de diplomas de educação superior que queiram se dedicar à educação básica".
Por educação básica entenda-se os níveis que antecedem a educação superior (educação infantil, 1º e 2º grau). Estamos falando em professores de física, química, matemática, geografia e outros, a cada dia mais raros.
O que se pretende é organizar cursos que licenciem profissionais de nível superior a lecionar no primeiro e segundo graus. Podemos imaginar médicos dando aulas de biologia e educação física; engenheiros, de matemática; advogados, de português; economistas, de literatura brasileira. Teríamos um exército de professores por adoção e não por formação.
Se não quisermos discutir a qualificação desse exército para vencer essa luta pela melhoria da qualidade do ensino ou se não quisermos refletir sobre o desrespeito que isso representa a uma classe profissional que tem a responsabilidade de formar os mestres, que pelo menos se discutam as chances de sucesso do investimento. Ao projeto subjaz a convicção de que esses profissionais, uma vez "treinados", poderão ser convencidos a lecionar por salários que equivalem a algumas horas de seu trabalho. Doce ilusão! Por maior que possa ser a nossa capacidade de fantasiar, é difícil aceitar que haja tantos missionários à sua volta.
As causas da fuga dos estudantes dos cursos que ainda formam professores são conhecidas. A solução também é por demais conhecida: basta melhorar os salários e as condições de trabalho dos professores de primeiro e segundo graus. A pergunta é: até quando vamos continuar construindo paliativos e fugindo do problema? Com quantas greves vamos ter que conviver até que se perceba que só um plano sério poderá garantir que nossos filhos tenham professores de física, química, literatura etc. -professores que possam orgulhar-se de ser apenas isso, professores?

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