São Paulo, quarta-feira, 26 de junho de 1996
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Destruição destruidora

ANTONIO DELFIM NETTO

Joseph Alois Schumpeter (1883-1950) foi um grande economista e historiador da economia. Talvez tenha sido o último construtor de uma "grande visão" da evolução da organização social dentro da qual maturou o capitalismo.
O seu primeiro livro, publicado em 1912, chamou-se "A Teoria do Desenvolvimento Econômico: Uma Investigação sobre o Lucro, o Capital, o Crédito, o Juro e o Ciclo Econômico".
Trata-se de um livro muito interessante porque, partindo da representação estática de um sistema econômico que se auto-reproduz, injeta nele um ingrediente -o empresário inovador- que modifica hábitos de consumo pela criação de novos produtos, que combina de forma diferente os fatores de produção, que abre novos mercados, que utiliza novos processos produtivos e que incorpora novas matérias-primas.
E com isso apropria-se dos lucros gerados pelo instante do monopólio inovador e que serão depois dissipados pelos que o imitarão.
Toda a concepção é dinâmica. Trata-se da "evolução" do sistema que se distingue do "crescimento", que seria uma repetição do mesmo sistema em maior escala. A "evolução" envolve o desenvolvimento de fenômenos qualitativamente diferentes. Ela é uma ruptura no sistema estático de equilíbrio, produzida pela intervenção do empresário-inovador que vislumbra uma possibilidade de lucro.
Esse animal especial, entretanto, não se move apenas em busca do lucro, mas também de poder, de prestígio social e da satisfação que provém da sua própria criação. Um ponto notável na teoria de Schumpeter é que o empresário-inovador socorre-se do crédito bancário, mobilizando recursos que darão lugar aos novos métodos produtivos e à ampliação da renda que gerará, por seu turno, a poupança.
A teoria explicita a evolução endógena (quase biológica) do sistema econômico. "Eu sentia fortemente -diz Schumpeter no prefácio à edição japonesa do seu livro- como era errônea a representação estática da economia.
Eu suspeitava da existência de uma energia no interior do próprio sistema econômico, capaz de destruir aquele equilíbrio". A semelhança dessa concepção com a de Marx é óbvia.
A esse processo de competição incessante e impiedosa, Schumpeter batizou no livro "Capitalismo, Socialismo e Democracia" (1942) de "criação destrutiva", porque os novos e dinâmicos inovadores constroem seu sucesso sobre os cadáveres dos antecessores.
O final melancólico dessa "grande visão" é o teorema de que o capitalismo não sobreviverá porque a sua própria eficiência minará as instituições sociais que o protegem. Schumpeter sugeriu que o socialismo seria seu "herdeiro presuntivo", o que mostra a sua limitação antecipatória...
O fantástico é que tal idéia de uma "criação destrutiva" ou de uma "destruição criativa" seja agora invocada pelas autoridades econômicas para depor a favor da "destruição destruidora" que estão produzindo pelo câmbio valorizado e pela maior taxa de juro real do mundo!

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