São Paulo, quinta-feira, 27 de junho de 1996
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Sob o signo da mentira

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - À margem do assassinato de PC Farias, enfrentamos uma realidade que não dignifica nosso tempo e, sobretudo, nossas autoridades. Registraram-se dois fatos públicos: o esquema de corrupção cujo beneficiário maior foi um presidente da República e um fato de sangue com dois cadáveres numa cama em Maceió.
São episódios relativamente simples e não chegam a ser inéditos na história da humanidade. Contudo, no Brasil deste final de século, a moral do poder está tão desvinculada do poder da moral que ninguém acredita em ninguém.
Num país em que o atual presidente da República nega o desemprego, em que a primeira-dama enaltece os méritos da sua solidariedade, em que ministros e autoridades mentem descaradamente, em alguns casos até cinicamente, como podemos acreditar nos laudos da polícia alagoana sobre a morte de PC Farias?
Estamos habituados a falsificações, há papéis catimbados, perícias viciadas, depoimentos forjados. O governo habituou-se à mentira que geralmente toma a forma do desmentido que não desmente nada.
Exemplo: FHC desmentiu que soubesse da crise do Banco Nacional desde outubro do ano passado. Todos sabemos que é uma mentira. Mas, para todos os efeitos, essa ficou sendo a verdade oficial.
As mensagens que o Executivo envia ao Legislativo são peças feitas com espantosa habilidade para que todos finjam acreditar nelas, embora sabendo que tudo é mentira. Esse acordo de cavalheiros não nasceu com Collor nem PC. Nem acabou com eles. Daí a impossibilidade de engolirmos os laudos e conclusões da polícia alagoana.
Dizia-se que o demônio era o pai da mentira. O Brasil vive sob o signo da mentira, não há exorcismo que o libere desse pacto satânico. Fica difícil excluir a hipótese de crime passional no caso de Maceió. Mas a pressa com que a tese foi aceita pelas autoridades de lá é mais do que suspeita. É diabólica mesmo.

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