São Paulo, domingo, 30 de junho de 1996
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Começa o FHC 2

LUÍS NASSIF

Poucos perceberam, mas desde o final do ano passado iniciou-se a fase dois do governo FHC.
Na fase um, toda ação do governo federal subordinou-se à aprovação das reformas constitucionais. Mais do que solução, as reformas serviram de álibi para o imobilismo.
Enquanto esperavam Ulisses, as Penélopes da Esplanada deixaram de lado questões relevantes que, para sua concretização, só dependiam de vontade política, capacidade de formulação e determinação gerencial.
Em qualquer plano de estabilização, a troca de moeda deve consumir não mais que um mês; a administração do dia-a-dia, todos os meses restantes.
Só que, para tal, há a necessidade de os formuladores entenderem a complexa engrenagem microeconômica que compõe o mundo real.
Mecanismos não-expansionistas de rolagem de passivos, instrumentos de crédito que permitissem minorar o sufoco geral, fórmulas não-cambiais de estimular as exportações, agilidade nas privatizações, estratégias de investimentos setoriais, criação de ambientes econômicos saudáveis, tudo isso exige um grau de conhecimento das engrenagens microeconômicas que vai muito além da experiência dos formuladores da primeira etapa.
O FHC 1 foi aquilo que se viu. A utilização exagerada do câmbio e dos juros a serviço de conceitos genéricos de estabilização, que deixou de herança um dos mais estúpidos processos de aumento dos passivos públicos e privados de toda a história.
Núcleo duro
Do fim do ano para cá, ocorreram dois fenômenos simultâneos.
Numa ponta, a estratégia equivocada do presidente -de amarrar as reformas exclusivamente à sua capacidade de seduzir as forças conservadoras- mostrou-se de fôlego curto, emperrando toda reforma que dependesse de dois terços dos votos da Câmara.
Na outra, a partir de mudanças registradas no segundo escalão, consolidou-se um núcleo operador dentro do governo que passou a escapar da armadilha das generalidades pouco objetivas da primeira fase.
Compõem esse núcleo técnicos da Fazenda, Planejamento, Casa Civil, Banco Central e BNDES.
Gradativamente, ainda que de forma lenta, as reformas infraconstitucionais começam a andar. A privatização das ferrovias ganhou novo impulso, assim como a do setor elétrico. Aceleraram-se as medidas de combate à inadimplência. Várias medidas setoriais foram adotadas, permitindo revigorar setores mais atingidos pela crise monetária.
A fase dois é relevante por demonstrar ao presidente que sua sustentação não está na nostalgia do Real, mas em conseguir apresentar um conjunto coerente de metas e resultados.
FHC 3
A partir dessa tomada de consciência, espera-se que se entre logo no FHC 3 -a terceira etapa, na qual o presidente terá de se empenhar pessoalmente em obter resultados, superando sua reconhecida ojeriza a gerenciar o dia-a-dia ou, pelo menos, aceitando transferir essas incumbências para um Cavallo nativo.
Nos próximos meses, haverá longa batalha para mostrar que o novo discurso governamental ("trabalho já, reformas quando Deus quiser") é coerente.
Em que pesem avanços obtidos em algumas áreas, a visão preponderante (e justa) é a de um governo pouco operacional.
Para ingressar logo na terceira etapa, o presidente necessita de alguns cuidados preliminares:
1) Reservar uma semana de trabalho geral do ministério para definir um conjunto de ações coerentes e factíveis de serem alcançadas até o final de seu governo.
2) Exigir de cada ministro o comprometimento com as ações, criando indicadores de desempenho e prazos rígidos de execução.
3) Informar a nação desses compromissos, mesmo correndo o risco de algumas das metas não serem alcançadas.
4) Colocar a Casa Civil para acompanhar o processo. Mas a cobrança, indelegável, será do próprio presidente da República. Na primeira etapa, o presidente transferiu as atribuições e o prometido gerenciamento por processos não saiu do papel.
5) No detalhamento de projetos, recorrer a grupos extragoverno, recrutados na universidade ou áreas afins, a fim de superar a reconhecida carência de quadros que marca hoje em dia a administração pública.

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