São Paulo, domingo, 30 de junho de 1996
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Inflamação provoca bloqueio de artéria

DA "NEW SCIENTIST"

Os ateromas não entopem as artérias simplesmente forrando-as de material gorduroso. Eles são produzidos por uma inflamação -uma reação do sistema de defesa do organismo.
O problema começa quando o endotélio -o tecido que reveste o interior da artéria- é irritado por lipoproteínas de baixa densidade (o chamado "mau colesterol"), componentes do fumo etc.
Células de defesa do organismo, chamadas macrófagos, se precipitam sobre o local da irritação, onde elas ficam repletas de lipoproteínas. Em seguida, elas são retiradas da corrente sanguínea e se acumulam na parede do vaso, formando faixas de gordura, os primeiros sinais da lesão.
Enquanto as faixas aumentam, a infecção piora e mais macrófagos são atraídos para o local. As células se acumulam mais e mais no revestimento do vaso sanguíneo e tornam-se fibrosas.
A hipótese da bactéria dos cardíacos diz que a Chlamydia pneumoniae ajudaria a acelerar o processo -ou até mesmo iniciá-lo.
Inflamação e infecção crônica são a marca registrada da família clamídia. Numa explicação grosseira, a Chlamydia pneumoniae pode inflamar a parede das artérias. Para que isso ocorra, no entanto, ela precisa ir do pulmão para as artérias coronárias.
Carona
Os adeptos da hipótese da clamídia acreditam que a bactéria pega uma carona com os macrófagos que passam pelos alvéolos do pulmão, entra na corrente sanguínea e então chega às artérias.
Os macrófagos são carniceiros que comem de tudo, não só o mau colesterol, mas também os agentes causadores de doenças, como bactérias. Quando, e se, a clamídia chegasse à parede do vaso sanguíneo, a infecção provocaria mais inflamação, atraindo mais macrófagos, criando um círculo vicioso de lesões.
A teoria é tão atraente que seus adeptos, pesquisadores em dúvida e mesmo os descrentes estão gastando tempo para testá-la.
A equipe da descrente Margaret Hammerschlag, da Universidade Estadual de Nova York, está infectando com clamídias ratos com tendência a aterosclerose. O objetivo é descobrir se eles desenvolvem a doença mais cedo que os animais que não foram infectados.
O crente Thomas Grayston, da Universidade de Washington, começou experiências similares com coelhos. Charlotte Gaydos, da Universidade Johns Hopkins, está infectando células endoteliais humanas em laboratório. Outros estão infectando macrófagos.
Recentemente, Gaydos tentou confirmar se macrófagos humanos podem levar a bactéria até as células musculares lisas, que ficam sob o revestimento da artéria. O experimento, se der certo, dará forte apoio à hipótese da clamídia.
Gaydos, no entanto, não divulgou seus resultados até agora. Os pesquisadores vão ter de esperar pelo congresso de Viena.
Descrentes
A comunidade científica mais tradicional, os "medalhões" da pesquisa cardiovascular, por enquanto continuam profundamente desconfiados da relação entre clamídia e doença coronariana.
Para aqueles que se preparam para defender a teoria, como Gaydos, isto não é surpresa. "Os gastroenterologistas (especialistas do sistema digestivo -estômago e intestinos) foram os últimos a acreditar na evidência de que uma bactéria causava a úlcera", diz a pesquisadora.
Enquanto os estudos conclusivos não ficam prontos, a descrente Hammerschlag dá um conselho prático: "Ainda não tome seus antibióticos profiláticos".

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