São Paulo, quarta-feira, 3 de julho de 1996
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Brasil e Rússia têm modelos semelhantes

GILSON SCHWARTZ
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Os modelos de estabilização no Brasil e na Rússia têm pelo menos uma importante característica comum, presente em outros modelos patrocinados pelo FMI: a exposição crescente às forças da globalização.
Antes da estabilização, as duas economias eram frequentemente comparadas. Em janeiro de 1993, Brasil (com 1.174%) e Rússia (com 2.000%) tinham as maiores inflações do mundo. A estabilização começou praticamente ao mesmo tempo, no início de 94 (quando a Rússia abandona a terapia de choque e no Brasil tem início o real).
No horizonte de ambos, a plena conversibilidade da moeda nacional e a liberalização comercial e financeira. Outra semelhança é que nos dois casos a estabilização teve várias etapas e alto custo social.
Na Rússia, a opção inicial foi pela liberação completa dos preços. No Brasil, houve vários congelamentos, mas afinal chegou-se também a uma fórmula sem congelamento.
No caso brasileiro, os juros altos foram necessários para atrair esses capitais. Na Rússia, além da privatização em massa tem havido o socorro financeiro generoso de governos e organismos multilaterais.
Mas a dificuldade de reformar instituições e redesenhar o Estado é comum. Nos dois casos está em jogo não só o combate à inflação mas uma mudança radical de modelo econômico (ajuste estrutural e reformas institucionais).
Na Rússia, a transição é do planejamento centralizado para uma economia de mercado exposta aos mercados globais. No Brasil, também está em jogo a desestatização com abertura econômica.
A estabilização com liberação de preços (e "flexibilização" do mercado de trabalho), com abertura e privatização, é uma mistura politicamente explosiva, seja o processo gradual ou de choque.
Na Rússia, Ieltsin teve de se defrontar com neofascistas, ultranacionalistas e neocomunistas, além das máfias que ganharam terreno num ambiente de desorganização do Estado e superinflação.
Surgiram também questões talvez mais difíceis de resolver que o combate à inflação. A reconversão do complexo militar-industrial, por exemplo. Ou a rediscussão das relações entre abertura econômica, liberalização financeira e interesses nacionais. Ontem mesmo, o general reformado Alexander Lebed lançou uma ofensiva para retomar o controle do "complexo energético"que tem "saqueado os recursos naturais do país" numa aliança com os bancos.
Ocorre que a privatização do setor petroleiro russo é um episódio obscuro, reconhecem os próprios organismos multilaterais. Na opinião de Lebed, aí reside um dos mais danosos núcleos mafiosos da nova economia russa.
No Brasil, também têm crescido as vozes contra a desnacionalização e a privatização de empresas estratégicas, como a Vale do Rio Doce ou mesmo a Petrobrás, assim como o desconforto político com as opções do governo em termos de saneamento do sistema bancário (que, na Rússia, também entrou em colapso).
O Banco Mundial alertou, na semana passada, para a popularidade declinante dos líderes latino-americanos que, nos últimos anos, promoveram reformas liberalizantes. A volta do populismo é um risco, na América Latina, comparável às dificuldades que fizeram de Ieltsin um mal menor.

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