São Paulo, sábado, 6 de julho de 1996
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Concubinato - Lei Nova

SILVIO RODRIGUES

A publicação da lei nº 9.278, de 10/05/96, que regulamenta o parágrafo 3º do art. 226 da Constituição, deve trazer perplexidade aos meios jurídicos brasileiros em virtude de a lei nº 8.971, de 12/94, haver disciplinado, também, alguns efeitos daquele mesmo dispositivo constitucional. Esta lei regulava os direitos sucessórios e alimentícios dos companheiros.
O parágrafo 3º do art. 226 da Constituição, que proclama estar a união estável sob a proteção do Estado, atribuindo ao concubinato o status de entidade familiar, teve, assim, duas leis que lhe regulamentaram os efeitos, uma atribuindo direitos sucessórios e alimentícios a uma espécie de conviventes e outra atribuindo direitos de natureza diversa a outra condição de companheiros.
A lei de 94 concedeu direitos sucessórios e a alimentos a companheiros desimpedidos, que convivam há pelo menos cinco anos ou tenham prole comum; enquanto a lei de 10 de maio atribui vários direitos aos conviventes, de convivência duradoura (não precisando perdurar por cinco anos ou ter prole comum), pública e contínua, estabelecida "com o objetivo de constituição de família".
Enquanto a lei de 94 desprezava o concubinato adulterino, pois só dava efeito aos conviventes solteiros, judicialmente separados, divorciados ou viúvos, a lei mais recente dispensa este requisito, visando proteger qualquer união, desde que tenha alguma duração e seja ostensiva.
A lei nº 8.971/94 concede ao companheiro ou companheira desimpedidos, cuja união dure mais de cinco anos ou tenha prole comum, direito sucessório ao cônjuge viúvo por outro regime que não o da comunhão universal; e concede-lhe, ainda, ação de alimentos contra o seu antigo companheiro, desde que prove sua necessidade e possibilidade do requerido.
A lei nº 9.278/96 reconhece como entidade familiar a união pública e notória de um homem e uma mulher, sem reclamar que os convincentes sejam desimpedidos ou que a ligação tenha prazo mínimo de duração. Abrange tanto ligações com menos de cinco anos como as caracterizadas na lei de 94.
A lei presume serem comuns os bens adquiridos durante o convívio, preceito importantíssimo faltante na legislação brasileira. Esta divisão do patrimônio deixa de se proceder em duas hipóteses: a) se houver estipulação em contrário em contrato escrito; b) se a aquisição do bem ocorrer com recursos havidos antes do início da união.
Em caso de morte de um dos companheiros, a lei ainda concede ao outro, enquanto não constituir nova união, o direito real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família, solução semelhante à concedida ao cônjuge sobrevivente pelo Código Civil. Outro dispositivo importante da recente lei foi o que atribui às varas de família a competência para decidir todas as questões relativas à união estável, que, de resto, correrão em segredo de Justiça.
A lei nº 9.278 era reclamada de há muito e sua edição preencheu enorme lacuna, principalmente em virtude da regra que cria a presunção de serem comuns os bens adquiridos durante o convívio. Mas não obstante, duas leis a regulamentar um mesmo preceito constitucional, aliás cheias de imperfeições, conduz à idéia de que o legislador fica devendo a consolidação da matéria, em um único diploma, coerente e sistemático.

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