São Paulo, quarta-feira, 17 de julho de 1996
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A abertura do seguro e da previdência privada

MARCIO CORIOLANO

O processo recente da economia brasileira já demonstrou a importância da abertura comercial dos mercados à concorrência externa.
O resultado no mercado de produtos é maior competição e, por via desta, mais eficiência operacional das empresas, ajustamento de custos, melhoria da qualidade das mercadorias e redução de preços finais ao consumidor.
No chamado comércio de serviços -financeiro, securitário e outros- a abertura comercial está sendo feita mais lentamente, em função de várias restrições e interpretações constitucionais e legais.
Vamos tratar aqui das atuais possibilidades de ampliação da concorrência nos mercados de seguros e da previdência privada, aberta pela maior exposição à concorrência externa.
Isso interessa muito ao consumidor de dois setores da economia que cresceram fortemente entre 1993 e 1995, aproveitando para desfazer algumas confusões quanto ao atual quadro legal.
Primeiro, a história. A atual legislação básica dos seguros é o decreto-lei nº 73, de 21 de novembro de 1966, e a de previdência privada aberta é a lei nº 6.435, de 15 de julho de 1977.
Embora desenhadas com todos os requintes de protecionismo, essas leis não estabeleceram restrições absolutas para instalação de companhias controladas pelo capital estrangeiro no Brasil. As restrições se limitam apenas para a compra de serviços no exterior, que somente pode ser realizada por intermédio do Instituto de Resseguros do Brasil (IRB).
Apesar de aberto o mercado, sabe-se que inúmeros pleitos foram fechados em gavetas no passado. Tanto que em 1986, quando o Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP), órgão normativo do setor, estabeleceu limites para a participação do capital estrangeiro, isso foi considerado um grande avanço.
A resolução CNSP nº 14/86 fixou o limite de 50% de participação do capital estrangeiro, limitado, por sua vez, a um terço do capital votante, para que o controle efetivo não saísse das mãos dos nacionais.
Essa situação prevaleceu até 1988, com o advento da atual Constituição Federal. A partir daí, apareceram algumas dúvidas de interpretação.
Na Constituição, o artigo 52 das Disposições Transitórias veda a participação de capital estrangeiro em instituições financeiras até que lei complementar disponha sobre o assunto, conforme o artigo 192 do texto permanente. A exceção foi feita para autorizações do presidente da República, quando decorrentes de reciprocidade, de interesse do governo brasileiro ou de acordos internacionais.
A dúvida vinha do fato de o artigo 192 se referir às instituições de seguros e de previdência privada aberta e o artigo 52 não, pois cita apenas as instituições financeiras.
A interpretação da Advocacia Geral da União foi que a vedação deveria se aplicar a ambos. De qualquer modo, a restrição criada em 86 pelo CNSP foi afastada, pois, no jargão técnico-jurídico, não teria sido recepcionada pela Constituição de 88. Em suma, o mercado ficou fechado mesmo, exceto autorizações caso a caso.
Recentemente, sobreveio a reavaliação da interpretação jurídica da Advocacia Geral da União a respeito do enquadramento do setor de seguros e de previdência privada aberta.
Em junho, ela reviu sua posição, à luz de questionamentos que vinham se sucedendo, e concluiu que a vedação à participação do capital estrangeiro não se aplica a essas instituições porque, certamente, financeiras elas não são. E mais: colocou uma pá de cal naquela restrição criada pelo CNSP em 86, que foi considerada ilegal. Está automaticamente revogada.
Qual o efeito dessa nova situação? Existem alguns empresários do setor que a minimizam, dizendo que várias seguradoras estrangeiras já operam no Brasil e que nenhuma delas ocupa posição expressiva no ranking.
Parcial verdade, pois desde o início de 1995 a Susep recebe mensalmente pelo menos um segurador estrangeiro não-radicado desejando conhecer o nosso mercado, para futuros negócios.
Em segundo lugar, sabe-se da estranheza que investidores estrangeiros dessa área sempre manifestaram sobre a convivência com um processo inflacionário crônico.
Em terceiro lugar, são poucos os investidores que tomam decisões de investir sem regras permanentes de acesso ao mercado. Agora, temos regras permanentes e temos economia estabilizada.
Em resumo, a partir da aprovação presidencial desse novo parecer, o mercado de seguros está aberto, e bem aberto. Resta apenas a abertura do resseguro, mas essa é outra história, que esperamos tenha um desfecho breve.
Essa abertura do resseguro deve ser feita com critério. Não há dúvidas de que o IRB deve ser preservado. Isso não pode ser confundido com qualquer previsão de reserva de mercado. O que se deve garantir é um IRB fortalecido e privatizado, para que o mercado tenha pelo menos uma companhia local de resseguro, independentemente das estratégias das grandes seguradores aqui instaladas e dos grandes resseguradores internacionais.
Trata-se, nesse caso, de também incentivar a concorrência, dessa vez garantindo a existência de pequenas e médias seguradoras, que encontrarão pelo menos nessa companhia local de resseguro um parceiro preferencial.
Em suma, o primeiro grande passo já foi dado. Com a nova regra de abertura comercial do seguro e da previdência privada aberta, teremos maior celeridade nas decisões para o aporte de novos capitais no mercado, novas tecnologias de gerenciamento, novos produtos, maior competição e preços mais adequados à capacidade de renda da população. Tudo isso é muito bom para o consumidor, que é o que realmente interessa.

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