São Paulo, quarta-feira, 24 de julho de 1996
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O PT e a CPMF

JOSÉ DIRCEU

Depois de aprovada a CPMF, em primeiro turno, a imprensa foi inundada por artigos condenando o PT por votar contra o novo imposto, "contra a saúde pública" e "contra a vida".
Alguns, a pretexto de acusar o PT de votar por "razões eleitoreiras" ou por puro oposicionismo, repetiram argumentos, do governo e do próprio presidente, de que "o PT vota contra a educação e a saúde". Outros chegam até a reconhecer que o governo transferiu R$ 60 bilhões para os detentores de capital, porém, por incrível que pareça, aceitam a CPMF e cobram do PT seu voto contra.
Todos reconhecem que o imposto é ruim, impopular. Mas, argumentam, "é uma emergência". Mesmo jornalistas econômicos, articulistas experimentados, aceitam que não há outra saída para salvar a Saúde além da CPMF. No mesmo momento em que o governo determina que a CEF e o BB assumam as carteiras imobiliária e rural do Bamerindus. Uma decisão política do presidente FHC.
Há ainda o segundo turno, mas, se aprovada, a CPMF entrará em vigor só em dezembro, e, só então, a Saúde receberá mais R$ 400 milhões. Logo, não é uma emergência.
Tanto é verdade que o ministro da Saúde, Adib Jatene, propôs que o Tesouro antecipe recursos para os meses de julho, agosto, setembro, outubro e novembro. E, se existem recursos para antecipação, é porque existiam para destinação à Saúde!
Ora, se a arrecadação da CPMF é para 97, por que não resolver o problema dos recursos para a Saúde dentro de uma reforma tributária? Aonde foi parar a proposta de Antonio Kandir com relação ao compulsório sobre o lucro?
Na verdade, desde janeiro de 95 o governo está insensível para a gravidade da situação da Saúde. Nada fez e não se preparou para o pior. A novela da CPMF, como a do Nacional, é mais uma prova da indecisão e incapacidade do governo FHC para enfrentar crises e problemas crônicos na área social.
Recursos existem, em valores iguais ou superiores aos da CPMF, mas para outras "emergências": operações de crédito para ruralistas, emissão de títulos públicos para o Proer. E -inacreditável- R$ 800 milhões, dois meses de CPMF, para convênios -eleitoreiros- com as prefeituras do PSDB e aliados.
A hipocrisia de uns e a dúvida bem-intencionada de outros chegam ao ponto de condenar a fidelidade partidária do PT, seu "monolitismo". O que o PT e sua bancada fazem é corriqueiro e normal nos países democráticos, onde parlamentar vota com a maioria de sua bancada e/ou com decisões partidárias.
O PT votou contra não por princípios programáticos ou ideológicos, ou para fazer oposição, mas, sim, porque existem outras saídas. Se o governo quer instituir o Imposto de Transações Financeiras, que o faça por meio de uma reforma tributária.
Aquela mesma que todos dizem que é a primeira prioridade, mas que não sai do papel, a não ser para reduzir alíquotas do Imposto de Renda e desafogar os bancos ou centralizar na União receitas dos Estados e municípios, como aconteceu com o Fundo de Estabilização Fiscal e com a proposta de desoneração do ICMS nas exportações e investimentos.
Todos os indicadores provam que o governo FHC reduziu os gastos na área social e, para combater o déficit público, tende a conter despesas de custeio na área da Saúde e na Previdência. A causa da falta de recursos é a alta de juros, que queima, no mínimo, 20% das receitas da União.
O PT sente-se responsável junto aos usuários, conselhos e movimentos de saúde pela implantação do SUS. Nos municípios que governamos, o SUS funciona e está implantado, sem fraudes, municipalizado e com controle social.
O PT votou contra porque tem propostas, como a emenda constitucional 169-A, do deputado Eduardo Jorge. Ela destina para a Saúde 30% de todas as fontes da seguridade social e 10% das receitas fiscais de Estados e municípios.
Para a atual situação de emergência, o governo, conforme a lei orçamentária de 1996, artigo 6º, parágrafo único, tem autorização para abrir créditos suplementares, mediante a utilização de recursos do Fundo de Estabilização Fiscal. Está obrigado também, pela lei 8.446 do Plano Plurianual, a destinar 30% do orçamento da seguridade social, excluindo o seguro-desemprego, para a Saúde.
Como vemos, um governo, com maioria de três quintos no Congresso, pode e deve ter recursos para a Saúde. Não faz porque não quer ou por razões inconfessáveis. Que não culpem o PT. Não vamos vestir a carapuça nem aceitar chantagem ou terrorismo barato. Vamos votar e prestar contas à sociedade.

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