São Paulo, sábado, 17 de agosto de 1996
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Poetas italianos discordam sobre Marx

FERNANDO DE BARROS E SILVA
ESPECIAL PARA A FOLHA

Com um discurso abertamente antiliberal, apoiado em grande parte na tradição marxista, os poetas italianos Edoardo Sanguineti (1930) e Lello Voce (1957) defenderam anteontem à noite, na Folha, a necessidade de relacionar transformação social e produção artística de vanguarda.
Ambos participaram do debate "As Vanguardas Artísticas e a Sociedade de Mercado", promovido pelo jornal. O evento contou ainda com a presença da professora de Teoria Literária e Literatura Comparada da USP, Aurora Bernardini, e do poeta e articulista da Folha, Nelson Ascher (mediador).
Sanguineti, que é também professor e crítico literário, é considerado hoje o principal nome da poesia italiana. Foi um dos líderes do movimento de vanguarda conhecido como Grupo 63. Lello Voce pertence ao chamado Grupo 93, inspirado no anterior.
Sanguineti iniciou o encontro abordando o "paradoxo das vanguardas", que acabaram sendo incorporadas às forças de mercado.
Recorrendo à pré-história dos movimentos de vanguarda, o poeta disse que a obra de Charles Baudelaire (1821-1867) é o marco inicial da modernidade na medida em que expõe o momento em que a burguesia trai seus princípios (liberdade, igualdade, fraternidade) e mostra o conteúdo de classe implícito em seu universalismo.
A Revolução de 1848 foi decisiva para Baudelaire e o destino de toda arte moderna, disse Sanguineti.
Lello Voce trouxe o problema para o presente. Depois que as esperanças de transformação social foram frustradas, depois que a "promessa revoluciónaria" que orientava os movimentos libertários foi por terra, quais as referências do artista que se pretende de vanguarda, perguntou.
"Quem são os aliados do artista após o fiasco da revolução?", insistiu Lello Voce.
Sem dar uma resposta conclusiva às provocações do colega, Sanguineti disse que a chave da questão deve ser buscada "em Marx".
Sustentou que a arte deve "comunicar as contradições e os choques do mundo contemporâneo". É isso, prosseguiu, que faz um artista como Samuel Beckett.
Aurora Bernardini perguntou se seria possível hoje uma poesia não assimilável pelo mercado. Sanguineti ressalvou que não bastam boas intenções. Citando Engels, disse que "Balzac foi infinitamente mais agudo do que a horrível bondade dos poetas socialistas contemporâneos de Marx".

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