São Paulo, domingo, 18 de agosto de 1996
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As preocupantes notícias de Cuba

GERARD COLBY; CHARLOTTE DENNETT

"Nelson estava irritado com Cuba. A ilha sediava investimentos Rockefeller de longa data, entre os quais a refinaria da Standard Oil, de Nova Jersey, e os títulos do Chase em mãos de Batista. (...)
A Revolução Cubana representava o que Nelson sempre havia temido em relação à América Latina, desde que primeiro expressara aos diretores da Standard Oil, 20 anos antes, sua preocupação com a possibilidade de 'perdermos nossas propriedades'. Ele passara a maior parte de sua vida política trabalhando para evitar uma Cuba. Desde que deixara Washington, vinha tratando do problema do desenvolvimento com um senso de urgência atípico entre os empresários e políticos norte-americanos. Suas atividades na Corporação Internacional de Economia Básica (Ibec) e na Associação Internacional Americana de Desenvolvimento Econômico e Social (AIA) refletiam essa urgência.
Contrariando todas as expectativas, a Revolução Cubana, ao erguer um Exército capaz de derrubar um ditador militar apoiado pelos EUA, confiscando fazendas e distribuindo as terras aos agricultores e camponeses, pôs fogo na imaginação de boa parte da juventude instruída da América Latina. O Brasil, que se aproximava de uma eleição presidencial, não era exceção nenhuma.
Quatro meses depois de o exército camponês de Fidel Castro entrar em Havana, o governador Nelson Rockefeller recebeu uma mensagem importante de Berent Friele, do Ibec, o assessor-chefe para a América Latina do Room 5600. Friele estava preocupado com os rumores políticos que percorriam seu próprio país. Dez dias antes o vice-presidente brasileiro João Goulart havia anunciado o lançamento de uma campanha contra 'os trustes norte-americanos que exploram a riqueza do Brasil'.
A notícia era preocupante. Nelson havia subestimado Goulart. Ele o conhecera em maio de 1956, quando o presidente Juscelino Kubitschek, ansioso por capital norte-americano, o enviara aos Estados Unidos para tranquilizar os empresários e políticos desse país. Nelson convidou Goulart para almoçar e pediu que Berle se juntasse a eles. 'Ando observando Jango (o apelido de João Goulart) com bastante interesse', escreveu Berle mais tarde. 'É um homem jovem, capaz de ir longe, mas não sei até que ponto está comprometido com outros interesses.' Quando falava em 'outros interesses' Berle se referia ao Partido Comunista brasileiro. Estava desconfiado, mas era difícil discernir se Goulart era apenas um patriota brasileiro favorável aos direitos dos trabalhadores ou se poderia chegar ao ponto de desafiar os interesses comerciais norte-americanos, caso em que teria que ser julgado instrumento do Kremlin.
Mas para o Departamento de Estado Goulart não passava de 'um oportunista total', destituído de 'ideologia e ideais', e em lugar disso 'consumido por uma ambição pessoal voraz'. Eles sabiam lidar com esse tipo de gente; não havia razão pela qual a presença de Jango no gabinete brasileiro pudesse transformar-se em obstáculo à participação norte-americana nos planos de desenvolvimento da Amazônia traçados por Kubitschek."

Trecho extraído do livro "Thy Will Be Done", de Gerard Colby e Charlotte Dennett (Ed. Harper Collins).

Tradução de Clara Allain.

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