São Paulo, terça-feira, 20 de agosto de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Luiz Gonzaga adota sotaque francês

MARILENE FELINTO
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

A vida e a música de Luiz Gonzaga, o sanfoneiro, o artista pop do baião, do xote, do xaxado e da expressão do sentimento sertanejo, misturam-se agora em narrativa com algum sotaque francês.
É uma música "à la fois joieuse et mélancolique..." (ao mesmo tempo alegre e melancólica).
Foi essa a primeira definição que a jornalista francesa Dominique Dreyfus, 51, ouviu sobre o fenômeno musical Luiz Gonzaga.
Corria o ano de 1948, ela vivia em Garanhuns, interior de Pernambuco, onde chegara aos 2 anos de idade para morar no sítio de seus avós franceses.
A definição é da mãe de Dreyfus, com quem a menina ouvia Gonzaga no rádio, enquanto aprendia português.
Seu doutorado é "uma análise da sociedade brasileira através do discurso do samba".
Em 1986, ao cobrir o festival de música brasileira "Couleurs Brésil", em Paris, de que Gonzaga participava, decidiu fazer a biografia do ídolo de infância.
Trocou cartas com o músico e veio, em 1987, passar uma temporada no Parque Asa Branca, residência de Gonzaga em Exu, sua cidade natal, em Pernambuco.
Em entrevista à Folha por telefone, de Paris, Dominique Dreyfus falou de seu "Vida do Viajante: A Saga de Luiz Gonzaga" e desse olhar franco-brasileiro sobre fenômeno musical tão nordestino.

Folha - Em que seu livro difere de outras biografias de Luiz Gonzaga?
Dominique Dreyfus - Eu acho que ele tem um ponto de vista mais pessoal e é mais completo porque tem uma dimensão de análise da música de Gonzaga.
E da música nordestina no contexto da música popular brasileira. Também a discografia e a musicografia incluídas estão mais completas.
Mas as biografias brasileiras são boas e eu utilizei muito todas elas.
Folha - Você enfrentou dificuldades para realizar a pesquisa?
Dreyfus - A maior dificuldade foi estar morando aqui na França nesse período em que eu escrevia de fato o livro.
Eu teria escrito mais rapidamente se estivesse no Brasil. Cada nome ou data que eu precisava verificar, cada consulta que eu precisava fazer, me custava muito tempo estando aqui.
Folha - Seu livro pode ser visto como uma análise de brasilianista sobre a música de Gonzaga?
Dreyfus - Eu espero que os brasileiros gostem do meu livro.
Agora, é claro que eu sou profundamente francesa, embora tenha sido alfabetizada primeiro em português e tenha passado a infância no Nordeste.
Sem dúvida, minha maneira de ver as coisas é também muito marcada por minhas raízes francesas, mas eu não sei o quanto isso me torna uma brasilianista.
Folha - A biografia está saindo quando já morreram o pai e o filho Gonzaga. Houve alguma interferência da família?
Dreyfus - Não, de nenhuma espécie. Até porque todos sabem que se trata de uma biografia autorizada por Gonzaga, ele que me deu os depoimentos em 1987, durante os dois meses que passei em Exu.
A família toda sempre me apoiou, mas eles ainda não viram o livro.
Folha - Você não conseguiu esclarecer um dos pontos obscuros da vida de Luiz Gonzaga, a dúvida sobre se Gonzaguinha era ou não filho legítimo dele. Por quê?
Dreyfus - Não consegui. Gonzaga sempre foi evasivo ao tocar nesse assunto.
Falava abertamente da esterilidade dele, mas quando se tratava de Gonzaguinha, ele só me disse "dei meu nome a ele" e não quis entrar em detalhes.
Gonzaguinha também se recusava a falar sobre isso, como todos na família.

Livro: "Vida do Viajante: A Saga de Luiz Gonzaga"
Autora: Dominique Dreyfus

Texto Anterior: Livro diagnostica medicina
Próximo Texto: Biografia mistura admiração e fatos
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.