São Paulo, sábado, 24 de agosto de 1996
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Justiça comum julgará 155 PMs do Pará

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA; DA AGÊNCIA FOLHA, EM BELÉM (PA)

O inquérito contra 155 policiais militares envolvidos na morte de 19 sem-terra em Eldorado do Carajás (PA), sob acusação de homicídio doloso (intencional), será transferido para a Justiça comum.
A Folha errou ao informar ontem que o juiz-auditor da Justiça Militar do Pará, Flávio Roberto Soares de Oliveira, ao escrever em seu despacho que rejeitava a denúncia, poderia determinar o arquivamento do inquérito.
O chefe de gabinete do Ministério da Justiça, José Gregori, havia dito anteontem que a decisão do juiz-auditor Soares de Oliveira poderia levar ao arquivamento do inquérito contra os 155 PMs.
Ontem, o procurador-geral da Justiça do Pará, Manuel Santino Nascimento Júnior, afirmou que o juiz-auditor Soares de Oliveira cometeu um erro técnico ao rejeitar a denúncia de homicídio doloso contra os 155 policiais acusados de envolvimento na morte de 19 sem-terra em Eldorado do Carajás (PA).
Mas, segundo ele, esse erro não deve levar ao arquivamento da denúncia. O procurador-geral disse que a denúncia será encaminhada à Justiça comum.
O procurador disse ainda que o juiz deveria apenas ter escrito em seu despacho a expressão "deixo de receber" e não a expressão "rejeito", como fez.
Isso porque a legislação atual estabelece que julgamentos de homicídio doloso cometidos por militares são de competência da Justiça comum.
"Tecnicamente, essa expressão 'rejeito' levaria ao arquivamento de toda a denúncia. Foi um termo inapropriado", afirmou ontem o procurador-geral da Justiça do Pará, Nascimento Júnior, por telefone, de Belém.
"Nesse caso, só caberia a nós (Ministério Público) um recurso para evitar o arquivamento", completou o procurador-geral, que prestou as informações sobre a denúncia à Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana na quinta-feira.
"Mas, no corpo do despacho, o juiz afirma que repassará tudo para a Justiça comum", acrescentou.
Essa transferência foi estabelecida na lei 9.299, do dia 7 de agosto. Segundo a lei, o julgamento de crimes dolosos cometidos por militares contra civis são de responsabilidade da Justiça comum, não da Justiça Militar.
O chefe de Gabinete da Justiça, José Gregori, disse ontem que "a confusão foi provocada pelo juiz, ao usar uma expressão inadequada", referindo-se ao despacho de Soares de Oliveira.
"Eu deixo claro no despacho que encaminho o processo em cumprimento à nova lei e ao Código de Processo Penal Militar", disse o juiz.
No despacho, ele cita a alínea "b" do artigo 78 do código que diz que "a denúncia não será recebida pelo juiz se o fato narrado não constituir evidentemente crime da competência da Justiça Militar".
"Uma leitura minimamente atenta ao documento mostra que o despacho em momento algum poderia levar ao arquivamento do processo", disse o juiz.
"Segundo a alínea b, a denúncia não é rejeitada, mas deixa de ser recebida. Isso faz diferença; é um errinho técnico, mas não paralisa o processo", disse o procurador-geral Nascimento Júnior.
Lesões corporais
Além do erro técnico com relação à denúncia de homicídio doloso, o juiz-auditor rejeitou a apreciação do crime de lesões corporais, que é de sua competência.
Segundo o procurador-geral, o Ministério Público do Pará entrará com recurso junto ao Tribunal de Justiça daquele Estado, na segunda-feira, para fazer com que o processo contra os militares que participaram do confronto em Eldorado do Carajás seja desmembrado em dois.
Pelo pedido do recurso, a denúncia que trata de lesões corporais teria de continuar sendo apreciada pela Justiça Militar, enquanto que a que trata de homicídio doloso seguiria pela Justiça comum.
Para o Ministério Público, o juiz errou ao tirar da Justiça Militar as acusações de lesões corporais graves.
"A nova lei não fala em lesões corporais. Só queremos preservar a correção jurídica para evitar uma desmoralização mais adiante", disse o procurador-geral.
Segundo ele, qualquer falha de procedimento, em qualquer detalhe, pode motivar um recurso dos advogados dos policiais ao STF (Supremo Tribunal Federal), que poderia anular o processo.
Essa é a segunda queda-de-braço entre Judiciário e Ministério Público neste caso. Quando os promotores ofereceram a denúncia em 12 de junho, o juiz não se pronunciou; mandou o IPM de volta à polícia e pediu novas diligências. Os promotores recorreram.

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