São Paulo, sábado, 24 de agosto de 1996
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Lição de amor

LUCIANO MENDES DE ALMEIDA

No dia 16 de agosto foram abertas ao público as portas de um museu diferente, instalado na torre do Centro Hospitalar Psiquiátrico de Barbacena (MG).
O museu há de conservar presente em nossa memória situações de grave injustiça para com os deficientes mentais, a fim de que não se repitam nunca mais. Com efeito, há 93 anos, o Sanatório de Tuberculosos de Barbacena foi desativado e passou a acolher o Hospital Geral dos Alienados, com 200 leitos.
Aos poucos, a superlotação crescente comprometeu a qualidade do atendimento. Em 1940, havia mais de 3.500 internos. Daí que Barbacena fosse, na época, conhecida como "cidade dos loucos".
No museu, as fotografias lembram a condição trágica e chocante daqueles anos em que os alienados eram vítimas do descaso e dos maus tratos. Aí viveram, sofreram e morreram mais de 60 mil seres humanos. Sem agasalho, despidos, não raro dormiam sobre o pavimento gélido, aconchegados uns aos outros. Caminhavam e deitavam nos lugares onde faziam suas necessidades.
O alimento era intragável. Compreende-se, então, o número elevado de óbitos, 180 ao mês, causados pela diarréia e doenças respiratórias. Podemos, apenas, imaginar o enorme drama desses sofredores, separados de suas famílias, relegados ao esquecimento justamente quando mais necessitavam de compaixão e auxílio.
O Museu da Loucura mostra uma época que, graças a Deus, já passou. Nestes últimos 15 anos, a ação corajosa de psiquiatras, médicos e enfermeiros que se opuseram ao que acontecia no hospital-colônia, com apoio da denúncia de jornalistas, permitiu que se iniciasse o processo de completa humanização no tratamento dos deficientes mentais.
Prestemos homenagem aos heróis anônimos e à atual direção, artífices da transformação do antigo manicômio mineiro. Deram-nos uma bela lição de amor cristão.
Quem, hoje, visita o Centro Hospitalar Psiquiátrico de Barbacena há de constatar o ambiente acolhedor que aí se criou. Os internos residem em lares, onde recebem esmerado tratamento médico, sadia alimentação, passeiam com liberdade pelos jardins e espaços de convivência. Tudo mudou.
A orientação psiquiátrica moderna procura que os deficientes físicos e mentais encontrem, em primeiro lugar na própria família, o afeto, cuidados e acompanhamento. No entanto, há casos que tornam indispensável a internação em centros adequados.
Barbacena, cidade das rosas e dos morangos, resgatou o seu passado. Hoje, abriga o Centro Psiquiátrico da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais, que pode servir de exemplo no tratamento de deficientes mentais.
Jesus Cristo, que se identifica com o faminto, o preso e o doente, revelou-nos a dignidade de cada pessoa humana. Ajude-nos a oferecer aos irmãos alienados o amor e cuidados a que têm direito como filhos de Deus.

D. Luciano Mendes de Almeida escreve aos sábados nesta coluna.

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