São Paulo, terça-feira, 27 de agosto de 1996
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SP poderá ser cobaia do "Fura-Fila"

LUIS HENRIQUE AMARAL
DA REPORTAGEM LOCAL

Caso o candidato Celso Pitta (PPB) vença a eleição, São Paulo será a cobaia da implantação de um sistema de transporte idealizado no início da década de 70 e nunca testado em grandes cidades.
Batizado de "Fura-Fila", ele é inspirado no "O-Bahn", da Mercedez-Benz da Alemanha.
A propaganda de Pitta diz que ele funciona "na Europa e na Austrália". Poderia ser mais exata e dizer que ele existe em apenas duas cidades, bem menores que São Paulo.
Ele funciona em Essen, na Alemanha, que possui 700 mil habitantes. População semelhante à de Maceió, capital de Alagoas.
Também existe em Adelaide, que tem 1 milhão de habitantes, a mesma população de Goiânia (GO), dez vezes menor que São Paulo.
Criatividade
Em Essen, o "O-Bahn" corre em apenas 12 km de trilhos, ligando o centro à periferia da cidade. Foi inaugurado em 1986.
"Em nenhuma das duas cidades ele atende grande demanda de passageiros ou mesmo é a espinha dorsal do sistema de transporte", diz Hugo Pietrantonio, do Departamento de Engenharia de Transportes da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo.
O "O-Bahn" é construído a partir do chassis de ônibus e é bem diferente do modelo apresentado pela propaganda de Pitta na TV.
"Houve um pouco de imaginação dos publicitários", reconhece Francisco Christovam, presidente da SPTrans (São Paulo Transporte), empresa municipal que gerencia o transporte público na cidade.
"O sistema não foi testado em grandes cidades. Mas alguém tem que começar, e nós achamos que é possível", diz Christovam.
A campanha de Pitta e a Prefeitura de São Paulo não têm um plano de implantação do sistema.
Ele deve passar na avenida Faria Lima, mas o projeto não indica se ele iria pelo canteiro central, no nível do chão, ou seria suspenso em uma espécie de "minhocão". Segundo o plano, ele deve correr, na maior parte, por viadutos.
O plano inicial prevê a implantação do sistema em um anel, de 70 quilômetros, distante, em média, 15 quilômetros do centro.
Se quiser mesmo colocar o plano em prática, a prefeitura terá que contornar o problema de que nenhuma empresa brasileira fabrica ônibus com essas características.
"O Brasil não tem cultura de fabricar esse tipo de ônibus. A minha impressão é que, depois da eleição, esquecem a idéia", diz Rogério Belda, presidente da Associação Nacional de Transporte Público.
"O ônibus biarticulado já é fabricado no Brasil, assim como o motor elétrico. A parte da roda-guia também não é complicada", rebate Christovam.
Para o consultor na área de transportes Adriano Murgel Branco, a idéia é "embrionária" mas "extremamente adequada a São Paulo". Ele colaborou na elaboração do projeto do "Fura-Fila".
Entusiasta do sistema, Gurgel Branco afirma que o motor elétrico do "Fura-Fila" não polui e é silencioso. Ele ainda afirma que a compra de passagens seria feita com antecedência, o que agilizaria o embarque e desembarque.
Segundo o engenheiro, a velocidade de implantação do sistema é rápida. "Em três ou quatro anos poderemos ter a rede completa."
Minhocões
Murgel Branco já discutiu o projeto com a Mercedez-Bens na segunda metade da década de 70, quando era diretor de trólebus do governo Olavo Setúbal.
Segundo João Alberto Corrêa, presidente da Herjack Engenharia e consultor na área de transportes, a grande vantagem do "Fura-Fila" é que ele corre por vias elevadas, tirando os ônibus comuns das ruas e aliviando o trânsito.
Corrêa trabalhou para a prefeitura de Lima (Peru), onde montou um projeto no estilo do "Fura-fila" em 1986. O sistema acabou sendo engavetado por falta de verbas.
O consultor destaca que a velocidade do "Fura-Fila" pode chegar a 30 quilômetros por hora, que é a média do metrô. A velocidade dos ônibus de São Paulo varia entre 5 e 12 quilômetros por hora.
Caso Pitta seja eleito, o plano da prefeitura é entregar a construção do "Fura-Fila" para empresas particulares, que teriam o direito de uso por concessão do serviço.
As empresas ficariam com o dinheiro pago nas catracas por um determinado número de anos, até terem retorno do investimento.
Nesse caso, a prefeitura definiria os locais de implantação e suas características. Segundo Christovam, o sistema de ônibus está com a capacidade saturada. "Não cabem mais ônibus em São Paulo."

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