São Paulo, sábado, 7 de setembro de 1996
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Prefeitura usa livro de ortografia antiga

FERNANDO ROSSETTI
DA REPORTAGEM LOCAL

A Secretaria Municipal da Educação de São Paulo comprou e distribuiu 1.065 coleções de livros escritos em português anterior à reforma ortográfica de 1971.
Os livros trazem palavras com os acentos extintos naquela reforma. Por exemplo: professôres, comêço, agôsto, s•mente, aquêles, êles.
As coleções foram distribuídas a cerca de 350 salas de leitura de escolas de 1º grau da rede municipal e estão à disposição, para retirada, de mais de 400 mil alunos.
Cada sala de leitura recebeu três coleções, cada uma composta por cinco obras clássicas de Julio Verne, como "20.000 Léguas Submarinas" e "A volta ao Mundo em 80 dias", oito volumes com "As Mil e Uma Noites" e uma "Antologia Ilustrada do Folclore Brasileiro" distribuída em oito volumes -por exemplo "Estórias e Lendas do Norte e Nordeste".
As coleções fazem parte de um conjunto de obras compradas pela secretaria de diversas editoras.
Flôres
O proprietário da editora Iracema, responsável pela publicação, Orlando Vicente, 58, disse que "a edição dos livros é recentíssima, é uma obra nova".
"Refizemos todos os fotolitos, a capa, tudo", afirmou. Apesar disso, aparentemente ninguém releu os livros. "Não é possível que os originais tivessem mais de 25 anos", exclamou Vicente em entrevista por telefone.
Para ele, a reforma de 1971 "não alterou basicamente nada no português. Flores com acento e flores sem acento não muda nada".
Vicente disse que teria de fazer um levantamento para saber quanto recebeu. É dele a informação de que foram vendidas à prefeitura 1.065 coleções -o que daria ao todo 22 mil livros.
Um livro do tipo comprado pela prefeitura -com capa dura e mais de 200 páginas- não sai por menos de R$ 5. Nesse caso, a prefeitura teria pago mais de R$ 100 mil.
A reportagem da Folha procurou a Secretaria Municipal da Educação ontem às 18h. A mulher que atendeu à ligação no gabinete disse que o secretário da Educação, Sólon Borges dos Reis, e seu chefe de gabinete já haviam saído.
A assessoria de imprensa da prefeitura também não localizou o secretário ontem no início da noite.
O caso foi denunciado ao Ministério Público da Cidadania pelo vereador Adriano Diogo (PT), por meio de uma representação, na quarta-feira passada.
A reforma ortográfica de 1971 foi fruto de um acordo entre os países de língua portuguesa e afetou apenas a acentuação das palavras.
Suprimiu o trema do hiato átono -escreve-se hoje saudade, não sadade. O acento circunflexo caiu de palavras como almoço e sobre.
Também foi extinto o acento grave ou circunflexo dos advérbios terminados em "mente": somente, superfluamente e cortesmente, por exemplo.

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