São Paulo, domingo, 15 de setembro de 1996 |
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Agricultura, classe média e violência
ALOYSIO BIONDI No começo dos anos 90, o preconceito contra os imigrantes nordestinos chegou ao auge em São Paulo, a ponto de um vereador desejar barrar sua entrada na capital. Nas rodinhas de conversas de pessoas bem colocadas na vida, era frequente ouvir que "os nordestinos estragaram nossa São Paulo".O desabafo partia de paulistanos e brasileiros da gema, como seus sobrenomes mostravam claramente: Feder, Schmidt, Fuad, Antonelli, Tanaka etc. A nenhum deles ocorria que seus pais ou avós também haviam aportado ao Brasil e a São Paulo na mesma condição de migrantes e que, em termos de "brasilidade", os nordestinos certamente têm três ou quatro séculos de tradição a mais. Como não lhes ocorria que o crescimento de São Paulo somente foram possíveis, durante décadas, graças à oferta de mão-de-obra barata proveniente de outras regiões. De qualquer forma, o surto preconceituoso estava totalmente fora de época. A migração de nordestinos para São Paulo, àquela altura, já era coisa do passado, sem que a sociedade o soubesse. Por que? Os dados do censo de 1990, divulgados somente no ano passado, mostram que 1981 a 1990 a região da Grande São Paulo teve um saldo negativo líquido nas migrações. Ou, em bom português: o número de pessoas que deixaram a região, de volta ou em busca de outras regiões, foi maior do que o número de pessoas que "entraram" na Grande São Paulo. Qual o saldo negativo? Nada menos de 1,3 milhão de pessoas. Numa década. Reviravolta - Esse dado estatístico é uma verdadeira "bomba", quando se analisam suas consequências. Ele mostra que estão furados, são falsos, todos os dados sobre o real tamanho da população da Grande São Paulo; sobre necessidade de escolas, hospitais, serviços de transporte, moradias etc. E, note-se bem: eles se referem ao período que vai de 1981 a 1990. De lá para cá, a tendência de "esvaziamento" de São Paulo -e, atenção, também de outras capitais do Sul/Sudeste e mesmo Centro-Oeste- se acentuou. Basta ver os dados da PNAD, pesquisa do IBGE, realizada em 1993 (não a de 1995, que o governo FHC aproveitou para fazer enorme onda, falsa). Os dados da PNAD de 1993 mostram que 4 milhões de empregos foram criados no campo a partir de 1990, isto é, em três anos 4 milhões de pessoas voltaram a trabalhar na roça. São os brasileiros "fugidos" dos grandes centros, expulsos pela recessão e o desemprego e que foram buscar meios de sobrevivência em minúsculos pedaços de terra de suas famílias -ou mesmo como posseiros ou sem-terra por esse Brasil afora. Moral da história - A violência nos grandes centros, que tanto está apavorando a classe média, seria muito maior não fosse o fenômeno de "êxodo" de milhões de pessoas rumo ao interior. Sem ele, miséria e desemprego seriam maiores. Se o governo der apoio àquelas milhões de famílias, no campo, estará não apenas criando emprego e renda para uma multidão de brasileiros marginalizados, mas também reduzindo a violência e os problemas sociais nas capitais (há necessidade de se investir muito menos quando se fixa essa população no interior). A classe média, que se considera a vítima maior da violência, pode deixar de olhar os sem-terra, os posseiros e os agricultores como habitantes de outro planeta, e entender que seus destinos estão interligados. É uma questão de bom senso, para a classe média, exigir que os governos dêem apoio efetivo ao pequeno e micro produtor, além dos agricultores de maior porte. Apoio que o presidente FHC tem anunciado. Mas que continua a ser sabotado pela equipe econômica FHC/BNDES. Texto Anterior: Aumenta na França a tensão social Próximo Texto: Roma e o Vêneto Índice |
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